
Recentemente, a notícia de que a United Airlines encomendou 50 aeronaves Boom Supersonic Overture animou os entusiastas e saudosistas dos voos que ultrapassam a barreira do som, mas será que a nova investida dos supersônicos de passageiros pode acertar onde o Concorde falhou?
O primeiro voo supersônico foi realizado em 1947 pela aeronave militar Bell Aircraft XS-1, comandada pelo lendário major Chuck Yeager, piloto de testes da recém-criada Força Aérea dos Unidos (USAF). Em pouco tempo, a tecnologia para quebrar a barreira do som já estava sob domínio de fabricantes comerciais que entraram em uma corrida para oferecer ao passageiro comum a oportunidade de voar em altíssima velocidade.

O franco-britânico Concorde e o soviético Tupolev Tu-144 foram os mais importantes modelos colocados à disposição das empresas aéreas. O primeiro era uma parceria das britânicas British Aircraft Company (BAC) e Rolls Royce, e das francesas Aérospatiale e a Société Nationale d’Étude et de Construction de Moteurs d’Aviation (SNECMA). Já o russo era uma criação 100% coordenada pela fabricante com sede em Moscou.
Ambos começaram a voar no final da década de 1960. No entanto, altos custos operacionais com combustível e manutenção (que refletiam nos altos preços das passagens), aliados a fortes limitações de conforto e serviços aos passageiros e a “explosão supersônica” que podia até danificar estruturas em solo, reduziram drasticamente sua popularização. Já fadados à aposentadoria, os voos foram definitivamente encerrados no começo deste século após um trágico acidente em Paris.

Boom Supersonic Overture
Após anos sem se falar em voos supersônicos de passageiros, nos últimos tempos começaram a aparecer novas empresas com esse objetivo. A Boom Supersonic é uma delas e quer ser a primeira empresa privada a construir de forma totalmente independente um avião supersônico voltado para passageiros.
Em junho passado, ela apresentou o protótipo XB-1, cuja tecnologia será base para o Boom Supersonic Overture, aeronave que deve estar no ar até o fim desta década. A fabricante promete eliminar os problemas que afligiam os operadores do Concorde.

O primeiro problema a ser superado é reduzir o consumo de combustível, intenso nas aeronaves anteriores, além de serem muito poluentes. De acordo com Beth Daley, jornalista da área de Meio ambiente e diretora do portal colaborativo australiano The Conversation, o Overture também deve ser o primeiro grande avião comercial a ter emissões de carbono neutras, com combustível de aviação 100% sustentável (SAF) e econômico.
A fabricante quer adaptar os motores para receber bio-querosene de Aviação, produzido a partir de compostos renováveis em substituição ao petróleo. Para reduzir ainda mais os gastos com combustível, a nova aeronave deve adotar motores turbojato ou turbofan.
Outro grande problema que deve ser superado pelo novo Overture é o da chamada explosão supersônica. Ao superar a barreira do som, um imenso estrondo é causado pelo deslocamento de ar o que pode causar danos em estruturas em solo. Por esse motivo, tanto o Concorde, quanto o Tu-144 não podiam chegar à sua velocidade máxima sobre o continente, o que diminuía substancialmente seus benefícios frente aos custos operacionais.
O Boom Supersonic Overture quer vencer esse desafio por meio um design arrojado. Com fuselagem estreita e desenho de flecha, o barulho de explosão deverá ser anulado. Em contrapartida, haverá menos espaço para passageiros: apenas 55 por voo, enquanto os antecessores chegavam a levar até 120 pessoas. Por ora, também não será possível o transporte de grande quantidade de carga, mas a velocidade máxima pode chegar 1.800 km/h (o dobro da velocidade dos aviões comerciais mais rápidos de hoje), com autonomia transoceânica de 8.334 km.
Nova era?
Apesar da limitação de transporte por voo, todas essas alterações tecnológicas tornam o Overture atraente para o mercado. Além das 50 encomendas para a United, a Boom também têm pré-reservas de dez unidades o grupo Virgin, do bilionário britânico Richard Branson, outras 20 unidades foram pedidas pela Japan Airlines e por outros três potenciais clientes ainda não identificados. O governo dos Estados Unidos também teria pedido um estudo para um Air Force One supersônico.
A Boom Supersonic quer que as passagens em seu avião custem apenas um pouco a mais do que o preço praticado em aeronaves tradicionais, pela comodidade da maior velocidade, sem impactar economicamente seus operadores.

A United informa que planeja receber o primeiro modelo em 2025, voar em 2026 e transportar passageiros até 2029. A companhia norte-americana é ambiciosa com as possibilidades da nova era supersônica e almeja conectar mais de 500 destinos em todo mundo na metade do tempo atual.
Entre as muitas futuras rotas potenciais para a United estão a tradicional ligação entre Nova Iorque e Londres em apenas três horas e meia, Newark para Frankfurt em quatro horas, e São Francisco para Tóquio em apenas seis horas. As aeronaves serão projetadas para receber recursos como telas de entretenimento nos assentos, amplo espaço pessoal e tecnologia sem contato.
A movimentação do mercado já anima outros investidores mundo afora. Empresas dos Estados Unidos, a NASA e diversas startups trabalham em diferentes protótipos supersônicos. Rússia, Japão e empresários europeus também trabalham para oferecer experiências além do som. Não há prazos claros sobre todos esses projetos, mas o certo é que uma nova era da aviação pode estar por vir.