A trajetória de um icônico Boeing 747 até seu fim cinematográfico

Originalmente “contratada” pela companhia aérea All Nippon Airways no final dos anos 1980 para atender algumas das rotas aéreas mais movimentadas do mundo, uma tarefa que serviu com grande sucesso por mais de duas décadas, uma unidade da Rainha dos Céus, a aeronave Boeing 747, acabou estrelando um importante filme de Hollywood e terminando como uma das principais atrações da Califórnia, o Universal Studios Tour, conforme você verá na matéria a seguir, de nossos parceiros do Aviacionline.

Boeing 747-100SR de matrícula JA8147 – Imagem: Ken Fielding / CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons

Após o lançamento do programa 747 pela Boeing no final dos anos 1960, cujos principais atributos de venda eram a possibilidade de transportar um número até então sem precedentes de passageiros em voos de longo curso, as companhias aéreas japonesas também viram no modelo uma aeronave que poderia se adaptar às particularidades do denso mercado do arquipélago, com grandes centros urbanos localizados a não mais de 1.500 quilômetros de distância.

Diante dessa necessidade, a Boeing desenvolveu a variante 747SR (Short Range, ou Curto Alcance) que abriu mão de quantidade de combustível e autonomia de voo, proporcionando em troca uma capacidade de até 498 passageiros. Com isso, os jatos também tiveram que ser submetidos a reforços em sua fuselagem, trem de pouso e asas para serem capazes de suportar mais de duas vezes mais ciclos de pouso e decolagem do que os 747s tradicionais (52.000 em 20 anos contra 24.000).

A Japan Airlines foi o primeiro, porém único, cliente do 747-100SR, com quatro aeronaves encomendadas em 1972, entrando em serviço comercial em outubro de 1973.

Em 1978, entretanto, foi adicionada uma subvariante, o Boeing 747-100BSR, com aumento do peso máximo de decolagem para 270 toneladas, que entrou em serviço no ano seguinte na All Nippon Airways (ANA) com uma configuração que alcançava até 528 passageiros. O modelo operou até 2006, conforme detalhado no website da companhia.

E é neste lote que aparece a Rainha protagonista desta matéria, que integrou a frota da ANA a partir de 25 de novembro de 1980 com a matrícula JA8147 (e número da linha 477).

Dados observados pelo Aviacionline por meio da Cirium, plataforma de inteligência aeronáutica, revelam que em junho de 2000 (período mais antigo disponível na série) a All Nippon Airways operava 581 voos semanais no Japão com seus 747, em rotas de Tóquio-HND a Sapporo, Fukuoka, Hiroshima, Hakodate, Osaka, Komatsu, Matsuyama, Nagasaki e Okinawa; e de Osaka a Sapporo, Fukuoka e Okinawa.

As principais foram Tóquio-HND a Sapporo e Tóquio-HND a Fukuoka, com até doze voos diários no Jumbo! As distâncias eram de apenas 821 e 882 quilômetros, respectivamente. A oferta dos assentos do 747 representou cerca de 20% da oferta doméstica total da ANA no Japão.

A companhia aérea tinha 29 aeronaves da família, sendo 5 da variante -200, 12 da variante -400 e 11 da -100BSR, esta última, lembre-se, a do nosso futuro astro de Hollywood.

E voltando a ele, o mesmo serviu à All Nippon Airways até maio de 2004, quando foi vendido para a Boeing e armazenado no aeroporto de Victorville, Califórnia, um dos principais cemitérios de aeronaves do mundo.

Boeing 747SR-81 da ANA registrado sob a matrícula JA8147

Mas, enquanto a aeronave chegava ao seu aparente destino final, a 150 quilômetros de distância dali, no Universal Studios, após cerca de dois anos de trabalho de pré-produção, Steven Spielberg estava acertando os últimos detalhes para começar a filmar um novo sucesso, Guerra dos Mundos, estrelado por Tom Cruise e a criança prodígio Dakota Fanning.

Uma das cenas mais chocantes do filme, que começa aos 39 minutos, se passa em um sótão da casa dos filhos de Tom Cruise e, em determinado momento, raios característicos dos alienígenas e também sons diferentes que não podem ser identificados precedem a uma forte explosão da qual eles são salvos ao se abrigarem em um pequeno quarto.

Com a calma novamente em cena, Tom Cruise sai do porão e encontra o motor de um avião pegando fogo e ainda girando dentro da sala da casa e, logo à frente, o nariz de um Boeing 747 separado do resto da fuselagem. O bairro agora é o local de um acidente de avião causado por alienígenas. Veja a cena abaixo:

A cena vista poderia ter sido alcançada com a tecnologia CGI (Computer Generated Imagery), mas com um orçamento de produção de US$ 132 milhões, isso era suficiente para comprar o 747-100BSR ex All Nippon Airways (JA8147 e depois registro N219BA), e movê-lo do deserto de Victorville até o Universal Studios para encenar o desastre aéreo.

Os custos da aeronave foram aproximadamente de US$ 60 mil para a fuselagem e entre US$ 200 mil e US$ 2 milhões para as tarefas de demolição, movimentação e montagem do cenário nos estúdios.

Boeing 747
O Boeing 747-100BSR no deserto de Victorville – Imagem: Aeroprints.com / CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons

Guerra dos Mundos foi um sucesso que arrecadou US$ 603 milhões em todo o mundo e acrescentou muitos negócios adicionais, incluindo a manutenção da cena do acidente de 747 como parte do Back-lot Tour do Universal Studios, aberto a visitação para o público.

E é assim que a Rainha que por mais de duas décadas serviu à All Nippon Airways agora está em Hollywood, a poucos metros do Bates Motel (Psycho):

O Boeing 747-100BSR no Universal Studios – Imagem: Google Maps

Confira o vídeo do tour pelos estúdios da Universal Studios:

Juliano Gianotto
Juliano Gianotto
Ativo no Plane Spotting e aficionado pelo mundo aeronáutico, com ênfase em aviação militar, atualmente trabalha no ramo de fotografia profissional.

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