Air Zimbabwe contrata piloto “fora da lei” para voar seu Boeing 777 para longe

Há algum tempo temos acompanhado a história desse Boeing 777-200ER da Air Zimbabwe e a cada novo episódio, em que ele está envolvido, a história fica mais estranha.

Inicialmente, o avião foi pintado nas cores da natimorta Zimbabwe Airways

A aeronave já esteve envolvida em todo o tipo de problema, desde corrupção a ligação com a ditadura de Robert Mugabe, sem contar o fato de que ela foi entregue duas vezes e que, após tê-la recebido, o governo descobriu que não tinha pilotos para operá-la e nem dinheiro para formar os profissionais. Enfim, essa é uma história um tanto quanto pitoresca e que vale a pena conhecer pelos links no fim dessa matéria.

Nessa semana houve outro capítulo controverso envolvendo a aeronave.

Para onde a aeronave foi dessa vez?

Em meio à pandemia e à baixa de demanda por voos, o Boeing 777-200ER da Air Zimbabwe, de matrícula Z-RGM, foi flagrado em rota de Harare para Addis Abeba, na Etiópia. O fato chamou a atenção por que a aeronave nunca havia voado desde que chegou no Zimbábue em janeiro.

Mais tarde, ainda no dia 14 de abril, a empresa aérea emitiu um comunicado em suas redes sociais, jogando alguma luz sobre o assunto.

O comunicado assim dizia: “A empresa aérea nacional posicionou hoje às 11h38 a seu B777-200ER Reg# Z-RGM ao Aeroporto Internacional Addis Ababa, Etiópia, para manutenção periódica obrigatória especial que não pôde ser realizada em Harare devido à indisponibilidade de equipamentos especiais de manutenção. A empresa licenciou engenheiros contratados da Asia Aero Technic, da Malásia, mas as tarefas de manutenção não puderam ser concluídas com sucesso aos padrões de conformidade exigidos em Harare na ausência de plataformas técnicas e equipamentos de teste”.

Espere aí, a Air Zimbabwe está dizendo que mandou para manutenção um Boeing 777 que ficou meses parado na Malásia em manutenção pesada antes de ser entregue em janeiro? Se parássemos o texto por aqui, já teríamos uma história estranha. Mas veja só quem pilotou o avião até a Etiópia.

Onde conseguiram esse piloto?

Tudo parecia normal até que o jornal Bulawayo24 soltou uma matéria falando sobre o piloto do voo. Veja só como noticiou o veículo:

“O avião foi pilotado pelo alemão Werner Heumann, que chegou a Harare na segunda-feira a bordo de um voo da Ethiopian Airlines que repatriava 30 cidadãos do Zimbábue, os quais estavam presos por bloqueios por coronavírus em vários países estrangeiros. Enquanto os zimbabuanos, a maioria retornando do Reino Unido e dos Estados Unidos, foram levados para uma instalação em Harare para uma quarentena obrigatória de 14 dias, Heumann e um cidadão suíço, Simon Erwin Jungen, foram autorizados a entrar no país, confundindo alguns funcionários do aeroporto”.

Ora, o país está com uma Lei em vigor que impede qualquer pessoa de entrar antes de passar por uma quarentena obrigatória de 14 dias e isso tem sido seguido a risca para qualquer pessoa. No entanto, dois cidadãos europeus, vindos de “hotspots” do coronavírus, são autorizados a entrar sem ter que passar pelo isolamento.

O jornal Bulamayo24 continua sua matéria informando que “a missão especial de Heumann ficou clara na terça-feira, quando ele foi o comandante do voo para o Aeroporto Internacional Addis Abeba, aterrissando às 15h38.

Talvez não tenha sido culpa dos homens, mas qual seria a urgência da Air Zimbabwe de mandar esse avião embora, sem que pudesse esperar mais um tempo até que as regras de isolamento baixassem. Até por que, nesse moment, quase ninguém está voando?

Pode ser que nem volte

De fato, pode ter sido uma despedida do 777 sem ao menos ter voado pela Zimbabwe após tantos vaivéns.

Chegamos a essa conclusão ao continuar lendo a carta da Air Zimbabwe, que diz que “as discussões e negociações estão em um estágio avançado com potenciais arrendatários pré-selecionados e uma posição final será oficialmente comunicada assim que um acordo for assinado, esperançosamente, nos próximos meses, à medida que continuamos a monitorar os efeitos do covid-19”.

Por esse trecho, interpreta-se que a empresa estaria para fechar o contrato com algum arrendador para a aeronave. Segundo ela, um contrato de arrendamento trará a receita em moeda estrangeira muito necessária para a Air Zimbabwe aumentar sua frota e que essa iniciativa faz parte do Plano Estratégico cujo foco principal é o desenvolvimento de hubs regionais / internacionais e turísticos robustos.

Pode até fazer sentido, apesar que a chance de fechar um contrato de leasing nos próximos meses é muito baixa em razão do cenário da aviação global. Além disso, parece que os planos da empresa de retomar os voos para Londres, de chegar ate a China, além de constituir um hub internacional em Harare, parecem ter ido por água abaixo.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

Veja outras histórias