Aos 23, primeira mulher afegã a pilotar um avião comercial diz que não abandonou seu sonho

Arquivo pessoal

Essa é a história de uma lutadora que foi do sonho ao pesadelo em uma noite, mais precisamente a do dia 15 de agosto, quando o Talibã assumiu o poder no Afeganistão. Desde então, Mohadese Mirzaee, uma jovem de apenas 23 anos e a primeira mulher a pilotar um avião comercial em seu país, está exilada.

A imprensa de todo o mundo relatou sua história. E então, em agosto, tudo desabou, e Mirzaee desapareceu, até que o The Guardian , o diário britânico a encontrou e fez com ela uma entrevista em que ela conta como foi sua saída do país.

Em 15 de agosto, ela estava no aeroporto de Cabul, pronta para decolar seu avião para Istambul, quando a notícia da captura da cidade chegou e centenas de famílias desesperadas invadiram a pista. O voo foi cancelado, mas depois de algumas horas ela recebeu uma oferta para embarcar para Kiev, na Ucrânia. Imediatamente, sem um período de reflexão, ela aceitou e disse adeus ao seu país. 

“Tudo aconteceu extremamente rápido”, disse ela ao Guardian, “foi uma montanha-russa emocional, deixei minha família pela manhã, disse adeus pensando em voltar, e nunca imaginei estar à noite no exílio“.

Chegando a Kiev, ela faz a análise dos vistos que possui ainda válidos e parte para a Bulgária, onde tenta reconstruir sua vida. Ela quer, acima de tudo, voltar a pilotar. 

Como os Talibã de hoje são os mesmos bárbaros de vinte anos atrás”, disse ela, “eles querem silenciar as mulheres, se eu desistir de minha paixão, elas terão vencido.  E isso está fora de questão”.

Há algumas semanas, ela tem se candidatado a cargos de piloto em empresas locais para buscar sua carreira, prometendo jamais desistir do que conquistou. Ela lembra que pagou por suas aulas de aviação fazendo bicos como caixa, depois que bateu por meses nas portas de empresas de aviação e que todos lhe diziam “não, mulher aqui não“, até conseguir e revolucionar um setor aéreo muito masculino na Kam Air. 

“Sabe, as mulheres afegãs lutam há décadas, aproveitamos todas as oportunidades, conquistamos tudo que era possível, mas hoje, mesmo que eu queira voltar, não posso, não há mais espaço para mulheres como eu no Afeganistão. Eu perdi tudo, mas vou lutar e vou voar. Se eu posso enviar um avião para o céu, posso fazer qualquer coisa”.

Há poucos meses, a aviação afegã via um marco, que foi atingido quando a primeira tripulação totalmente feminina realizou um voo comercial no país. Hoje, tão pouco tempo depois, nos rádios das cabines das aeronaves já não se ouve uma voz de mulher. Enquanto o Talibã estiver no comando, a chance disso acontecer será extremamente remota.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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