
Ao julgar um recurso do Ministério Público Federal (MPF), o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) condenou um homem estrangeiro pelo crime de importunação sexual contra uma passageira em um voo vindo de Doha, no Catar, para o Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP).
O réu foi condenado a um ano de reclusão, em regime aberto, além do pagamento de R$ 5 mil a título de reparação mínima pelos danos causados pela infração penal.
O caso ocorreu em 2024 e gerou um auto de prisão em flagrante do réu, apesar de os comissários de bordo não terem formalizado a ocorrência. O MPF, então, apresentou denúncia à Justiça Federal de Guarulhos. No entanto, a Justiça absolveu o réu por entender que não havia provas suficientes para a sua condenação, levando o MPF a recorrer da decisão.
No recurso, o procurador da República Thiago Augusto Bueno apontou que foram comprovadas a materialidade e a autoria do delito. Ressaltou que os depoimentos da vítima e das testemunhas foram coerentes entre si e suficientes para demonstrar o ocorrido. Por fim, requereu “a reforma da sentença para que seja devidamente valorizada a prova constante dos autos, reconhecendo-se que restou comprovada a autoria do crime de importunação sexual praticado.”
O caso
A vítima, uma mulher brasileira, viajava sozinha e percebeu que o homem na poltrona ao seu lado apresentava comportamento estranho enquanto a encarava. A vítima procurou uma comissária de bordo e trocou de poltrona. Ela foi realocada entre dois passageiros, também brasileiros, e contou a eles sobre a importunação sexual que havia sofrido. Um dos passageiros afirmou em seu testemunho que um dos comissários relatou ter tomado providências para acionar a Polícia Federal no momento da chegada da aeronave.
No entanto, após o pouso, o réu não foi interceptado no desembarque, o que causou certo espanto na vítima e nos dois passageiros a quem ela havia relatado os fatos. Diante disso, a vítima, acompanhada dos dois passageiros como testemunhas, procurou o controle migratório, que acionou a Polícia Federal, resultando na prisão em flagrante pela prática de importunação sexual.
Julgamento com perspectiva de gênero
A procuradora regional da República Cristina Marelim Vianna, que atuou no processo em segunda instância, destacou em sua manifestação que, “embora o fato relatado tenha ocorrido a bordo de uma aeronave comercial, enquadra-se na situação de clandestinidade”.
Segundo ela, dadas as especificidades de horário, condições de luminosidade e as circunstâncias do voo noturno, o fato ocorreu sem a presença de testemunhas, tripulantes ou passageiros, em um momento em que as luzes da cabine estavam apagadas e os passageiros descansavam. Para Vianna, o contexto “aumenta o real valor probatório do depoimento da vítima de importunação sexual”.
A importância do testemunho da vítima também foi enfatizada no acórdão do TRF3. O Tribunal destacou que a Resolução n.º 492 do Conselho Nacional de Justiça estabelece a adoção de Perspectiva de Gênero para os julgamentos do Poder Judiciário. O objetivo é colaborar com a implementação de políticas relativas ao enfrentamento da violência contra as mulheres no Poder Judiciário e incentivar a participação feminina no Judiciário.
O Protocolo para julgamento com perspectiva de gênero 2021 indica que os critérios que orientam os processos criminais devem ser “lidos com as lentes de perspectiva de gênero. Assim, é necessário observar a realidade da vítima e sua situação de vulnerabilidade”, afirma o acórdão.
O Tribunal ainda salientou que não há elementos que retirem a credibilidade das declarações prestadas pela vítima ou pelas testemunhas. Por fim, o TRF3 julgou procedente o recurso do MPF, reformando a sentença que absolveu o homem e condenando-o pelo crime de importunação sexual.
Informações do MPF