Avião Embraer E2 novinho tem pane no 1º voo comercial; isso é um problema?

Receba essa e outras notícias em seu celular, clique para acessar o canal AEROIN no Telegram e nosso perfil no Instagram.

Avião Embraer E195-E2 KLM Cityhopper
E195-E2 da KLM – Imagem: Embraer

Na semana passada, acompanhamos mais uma aeronave E195-E2 nova de fábrica sendo entregue pela Embraer para a KLM Cityhopper, subsidiária regional da holandesa KLM.

Registrado sob a matrícula PH-NXD, este E195-E2 foi o segundo dos quinze jatos do modelo que a empresa de leasing Aircastle entregará à KLM até 2024. Com isso, junto aos outros dois exemplares do mesmo modelo que a companhia aérea já tinha recebido sem ser da Aircastle, sua frota chegou a quatro E2, dos 25 encomendados.

O voo de translado para Amsterdã partiu no domingo, 16 de maio, efetuou uma parada técnica rápida, de cerca de 1 hora, em Recife e outra de cerca de 2 horas e 30 minutos na ilha espanhola de Tenerife. Então voou rumo à Europa continental na segunda-feira, 17, em seu trecho final até a Holanda.

Depois de poucos dias desde que foi recebido pela KLM em sua base, o PH-NXD foi então escalado para realizar seu primeiro serviço comercial com passageiros, o voo KL-1603 de Amsterdã para o Aeroporto Fiumicino de Roma, na Itália, neste sábado, 22 de maio.

A aeronave partiu para o serviço, mas, conforme reporta o The Aviation Herald, logo quando estava iniciando sua subida ao decolar da pista 24 de Amsterdã, a tripulação avisou que seu trem de pouso não respondeu ao comando de recolhimento.

Cerca de 5 minutos depois, a tripulação comunicou que a pane havia sido resolvida e eles poderiam continuar para Roma, pois o trem de pouso finalmente havia sido recolhido. Eles, porém, estavam ainda consultando a manutenção da companhia aérea.

Mais alguns minutos e o piloto voltou a falar com o controlador de tráfego, definindo que a opção foi por voltar para Amsterdã. O trem de pouso foi baixado corretamente na aproximação e o E195-E2 pousou com segurança na pista 27 cerca de 35 minutos após a partida.

A plataforma RadarBox registrou o percurso da aeronave, mostrando que a mesma chegou a atingir os 15 mil pés de altitude antes de iniciar seu retorno à base operacional da KLM.

O E195-E2 iniciando seu retorno a Amsterdã no sábado – Imagem: RadarBox

Após o pouso, os passageiros foram desembarcados e transferidos para outro Embraer 195-E2 da companhia, de PH-NXB, que chegou a Roma com um atraso de cerca de 3 horas em relação ao horário que a primeira aeronave pousaria.

O PH-NXD permaneceu em solo até este domingo, possivelmente passando por verificações e/ou intervenções da equipe de manutenção, e já voltou a operar, cumprindo os voos KL-1829 e KL-1830, de ida e volta a Berlim, na Alemanha, aparentemente sem novas panes, conforme os registros do RadarBox.

Problema com um produto novo

A situação de uma pane com um jato que acabou de ser recebido da fábrica e executava seu primeiro voo pode levar muitas pessoas a considerarem um absurdo o fato de algo novo apresentar problema.

Mas tal ocorrência precisa ser analisada com calma e de forma técnica, sob dois aspectos relevantes.

O primeiro aspecto é que, sem dúvida, tanto a companhia aérea KLM quanto a Embraer avaliarão a pane ocorrida para definir sua causa, e assim saber se necessita de uma atenção especial ou se foi algo dentro da normalidade. Pode parecer estranho para um leigo chamar de “normalidade”, mas em termos técnicos, falhas são esperadas em todo sistema mecânico, e existem redundâncias para que a falha não afete a segurança do voo.

E essa questão da ocorrência de falhas nos leva ao segundo aspecto, que é aplicável a qualquer produto novo, incluindo aviões. Na engenharia, a vida operacional de um produto ou sistema é caracterizada por uma curva de ocorrência de falhas, que é também batizada de “curva da banheira” devido a sua característica visual, que se parece com uma banheira vista de lado.

A “curva da banheira” da taxa de falhas de um produto ou sistema

Mas o que nos diz essa curva da banheira?

Veja que na ponta esquerda dela, que representa o começo do tempo, ou seja, quando o produto é novo, a taxa de falhas é alta. É a chamada fase de “infância”, em que possíveis problemas que foram herdados, por exemplo, do processo de fabricação se apresentam. É o que pode ter acontecido com o E195-E2 da KLM ao ter uma pane logo em seu primeiro voo comercial.

Então, a linha da taxa de falhas diminui até se estabilizar, dando início à fase “adulta”. Isso mostra que, depois de resolvidas as falhas iniciais que possam ter aparecido, ao longo do resto da vida operacional do produto ele apenas apresentará algumas poucas falhas. São aquelas falhas citadas mais acima nesta matéria, que são normais e esperadas de acontecer, e são geralmente cobertas pelas redundâncias desenvolvidas exatamente para manter a segurança.

Por fim, depois de um longo tempo de uso, a curva do gráfico mostra que a taxa de falhas volta a subir, dando início à fase de “desgaste”. Como sabemos, qualquer produto ou sistema começa a dar muitos problemas e muitos gastos com manutenção depois de velhos, e isso se reflete na subida da taxa de falhas do gráfico. É o momento em que se avalia a aposentadoria, pois o custo das manutenções e reparos torna financeiramente inviável a continuidade do uso.

Portanto, antes que se julgue que a falha no Embraer E195-E2 da KLM representa um problema por ter ocorrido com um avião novo, é preciso ter em mente que somente a companhia e a fabricante poderão avaliar e determinar o que aconteceu. Foi uma falha do projeto? Foi uma falha da montagem? Foi uma falha da forma de operar o sistema? Foi uma falha normal e esperada? Somente elas poderão dizer.

Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

Veja outras histórias