Início Novidades

Brecha na lei leva empresa aérea a criar táxi-aéreo para servir como ‘Buser’ dos ares

Uma solução inusitada e posicionada como ‘xeque-mate’ foi tomada por uma companhia aérea americana, que atua como terceirizada e criou uma outra empresa para ser subcontratada dela. Entenda.

Foto: Cory W. Watts

Atualmente, o mercado de pilotos de avião nos EUA passa por uma de suas piores crises, com falta de profissionais nas companhias aéreas, que estão dobrando os salários para atrair e, principalmente, reter os tripulantes. Como falado anteriormente nesta análise, o mercado sofre uma distopia criada por uma lei que aumentou em até seis vezes a experiência exigida para pilotar aviões de companhia aérea, sob o regimento de número 121.

Após uma série de acidentes, os EUA mudaram a regra de horas de voo para os ‘operadores 121’. As empresas, por sua vez, sempre tentaram voltar à regra antiga ou reduzir os requisitos. Sem sucesso, até agora.

A SkyWest é uma das gigantes do setor regional americano, com contratos com a Alaska Airlines, American Airlines, Delta Air Lines e United Airlines. Nestes acordos ela fornece aeronave, tripulação e manutenção para os voos das marcas regionais das grandes empresas. Por pagar menos aos seus pilotos, exatamente por ser uma terceirizada, ela tem dificuldades em atrair novos profissionais, principalmente pelos altos requisitos legais para o cargo.

Porém ela decidiu “inovar” para “dar a volta” na lei.

Nos EUA, assim como no Brasil, é possível que empresas de táxi aéreo, que estão sob o regimento 135 (que é bem menos exigente que o 121), possam fazer voos regulares em certas condições. Enquanto a brasileira ANAC e outras estrangeiras limitam que os táxis aéreos possam fazer voos em aeronaves pequenas e em rotas não atendidas pelas grandes empresas regulares (121), os EUA abordam de outra maneira.

Por lá, permite-se que operações “regulares excepcionais” sejam feitas em qualquer rota, desde que seguindo algumas restrições (que veremos a seguir) ou se sub contratados para outra empresa, o que configuraria um chamado “fretamento aberto ao público”.

É uma espécie de negócio similar ao que a Buser faz no Brasil no segmento de ônibus, ou seja, cria grupos para o fretamento, sem entrar nas regras normais da ANTT com concessão de rotas rodoviárias. Também é uma tática usada pela Uber, que não se encaixa nas regras de táxi.

Sendo assim a SkyWest não precisa seguir as exceções da regra 135 em casos de voos regulares excepcionais, que não permitiriam o uso de jatos, nem aviões com mais de 9 assentos e mais de 5 voos semanais em rotas já atendidas pelas empresas da categoria 121.

Imagem: JetSuiteX

Mas o principal ponto são novamente os pilotos: empresas de táxi aéreo, ainda que prestando serviço para companhias do regimento 121, não precisam de ter pilotos com ao menos 1.500 horas de voo, e sim 250 horas, que é o mínimo que o aviador faz ao obter a licença de Piloto Comercial.

Com isso, a SkyWest conseguirá contratar pilotos direto das escolas e universidades de aviação, sem precisar esperar que eles passem das mais de mil horas de voo. A única limitação será usar aviões com até 30 assentos. Para isso a empresa vai limitar os seus jatos Bombardier CRJ-200, que serão transferidos para a nova divisão, colocando apenas 30 poltronas ao invés de 50, segundo consta nos documentos enviados pela SkyWest ao Departamento de Transporte dos EUA.

Esta tática, porém, não é nova. Outra empresa, a JSX com seus jatos Embraer (foto acima) é uma subsidiária da holding JetSuiteX, empresa que “cria” os voos fretados e os oferece ao público, mas o avião pertence à sua ligada.

No entanto, será a primeira vez que isto acontece numa empresa que já é terceirizada, criando uma espécie de “subterceirização”. No caso, a SkyWest Charter (SWC), a nova empresa no regimento 135, será contratada pela SkyWest Airlines para fretamentos abertos por esta, em rotas que são comercializadas pela contratante.

O que soa confuso inicialmente, é apenas um “buraco na lei” nunca usado por uma empresa aérea regular (121). Inclusive nos EUA existe o termo “Fake Airline”, ou Companhia Aérea Falsa, para a prática feita pela JSX e futuramente pela SWC.

Pilotos tem reações mistas

Em conversa com pilotos americanos que voam em companhias aéreas terceirizadas e nas “principais”, o AEROIN viu reações mistas sobre a novidade da SWC. O bate-papo aconteceu num grupo de aviadores que formaram numa mesma instituição nos EUA e, por questão de privacidade, não terão os nomes revelados.

“Então a SkyWest achou um buraco nas leis feitas sob o sangue dos acidentes causados por inexperiência e falta de maturidade dos pilotos. É uma aventura ridícula, espero que ninguém saia ferido”, afirmou um primeiro-oficial de Boeing 757 de uma das três maiores empresas dos EUA.

Já um ex-piloto militar, que trabalhou em empresas aéreas e hoje é investigador de acidentes aéreos na NTSB tem uma opinião diferente: “É uma idéia brilhante na minha opinião, ninguém imaginava fazer esse tipo de terceirização”.

Divulgação – American Eagle

Por fim, o Piloto-Chefe de outra empresa aérea que presta serviços terceirizados à American, Delta e United afirma que o objetivo é o aumento da experiência dos novos pilotos dentro da própria companhia, dando maior oportunidade e aconselhamento.

“Com o aumento das contratações nas grandes empresas, nas de baixo-custo e outras, eles tinham que fazer algo. O pagamento com certeza não será bom, mas será melhor remunerado e melhor do que ficar fazendo mil horas como Instrutor de Voo. Por outro lado as exigências operacionais não são tão altas quanto na 121. Como sempre, o tempo irá dizer se valeu de algo”, afirmou o comandante que voa também jatos CRJ.

Todo o processo para a certificação da SWC ainda irá demorar meses e pode enfrentar processos na justiça, principalmente dos sindicatos dos pilotos das grandes empresas, que já limitam as operações das terceirizadas, que não podem comprar os novos aviões da Embraer.

Sair da versão mobile