Como será a retomada dos serviços aéreos após a pandemia: análise

Apesar da pandemia de Covid-19 mostrar números decrescentes na maior parte do mundo, ainda há desafios pela frente para o setor aéreo. Com base nisso, Rod Concepcion é gerente de Desenvolvimento de Negócios e Engenheiro de Soluções Sênior para Avionics da VIAVI, fez uma análise sobre o que há de vir.

Abaixo, o AEROIN compartilha a análise completa do executivo e sua visão para o futuro.

“Sem precedentes é uma expressão frequentemente utilizada para descrever como a pandemia global de Covid-19 transformou as relações ao redor do mundo. Além do grande impacto social que vivenciamos, as consequências nas indústrias aeronáutica e aeroespacial são certamente um exemplo dos efeitos da crise econômica. Uma queda acentuada nas viagens aéreas resultou em serviços de voo drasticamente reduzidos ou suspensos, trabalhadores dispensados ​​e uma demanda mínima por novas aeronaves que se propagou pela cadeia de suprimentos. Uma consequência inevitável desse declínio foi o aterramento de aeronaves em grande escala, com 64% dos aviões colocados em armazenamento durante 2020.

Felizmente, com o avanço da vacinação, crescimento da demanda por serviços e a abordagem de “conviver com a Covid”, temos acompanhado a retomada gradual do setor. Procedimentos e processos para armazenamento e retorno ao serviço (RTS) de aeronaves que ficaram guardadas por um longo período são bem estabelecidos e inclusos nos Manuais de Manutenção de Aeronaves (AMMs), contudo, a escala, a duração e a diversidade das condições de armazenamento exigidas pela pandemia ainda representam desafios únicos.

Órgãos e especialistas em padrões globais de aviação variam em suas opiniões e orientações para a retomada, mas um foco geral em pessoas, processos, equipamentos e ferramentas é consenso para sustentar o sucesso do retorno.

Pessoas são o catalisador

No novo normal, pessoas (e seus conhecimentos) serão ingredientes insubstituíveis. No setor aéreo, o tempo de inatividade prolongado fez com que muitos pilotos experientes se aposentassem ou deixassem a profissão. Agora, os profissionais que regressam ao trabalho passam por um treinamento de reciclagem para garantir a segurança do voo.

O mesmo dilema é enfrentado por equipes de manutenção, que lutam para acomodar as estimadas 250-450 horas-homem (MH) necessárias para colocar cada avião armazenado de volta ao serviço.

Mudanças nos processos de serviço

Embora muitos processos que envolvem o retorno às atividades sejam os mesmos (ou semelhantes) às tarefas realizadas antes da pandemia, o armazenamento de longo prazo demanda outros cuidados. Quando em serviço, a aeronavegabilidade de um avião é continuamente verificada por meio de feedback contínuo da tripulação e revisões regulares. Já na aeronave parada, os fatores associados a riscos ambientais, eletromecânicos e de erro humano aumentam.

Outra variável importante é a duração do tempo fora de serviço. Em circunstâncias normais, o tempo de armazenamento é planejado com antecedência para que um plano de manutenção adequado possa ser seguido. Em muitos casos, a incerteza da desaceleração da pandemia impediu que isso acontecesse.

Em reconhecimento a essas circunstâncias, a orientação da EASA (Agência Europeia para a Segurança da Aviação) para retorno ao serviço pós-pandemia, divulgada em julho de 2021,  recomenda uma revisão completa dos riscos com base nas condições de pré e pós-armazenamento da aeronave, bem como na manutenção que foi (ou não foi) concluída durante o tempo de serviço.  

Foco nos equipamentos

O objetivo final da inspeção de retorno ao serviço, testes e outros processos é garantir que todos os equipamentos e sistemas que mantêm a aeronave operacional e segura estejam em perfeitas condições. Com aviões modernos compostos por milhões de componentes, as atividades devem priorizar os elementos mais críticos, como motores, equipamentos de navegação e tanques de combustível, bem como sistemas de controle climático e outros elementos que garantem conforto e segurança aos passageiros.

Os impactos do armazenamento podem variar significativamente, embora as condições externas sejam mais propensas a induzir problemas como corrosão (ferrugem), danos aos pneus, deterioração da cabine e entrada de água nas linhas de combustível, especialmente em regiões úmidas.

Os tubos de Pitot e sensores externos usados ​​para medir a velocidade do ar, por exemplo, podem ser facilmente bloqueados por insetos, sujeira ou areia, levando a leituras errôneas (e perigosas) no cockpit.

Além disso, os sistemas elétricos são altamente suscetíveis a interferências, umidade e estática e as baterias podem descarregar. Por isso a condição de operação de importantes sistemas de controle de voo, unidades auxiliares de energia (APUs), altímetros, antenas e rádios devem ser verificados.

Ferramentas importantes

Além da ênfase no treinamento de técnicos, avaliação de risco e aderência aos padrões, a manutenção das ferramentas e suprimentos necessários para apoiar o retorno também deve ser uma alta prioridade. Isso começa com itens de EPI e se estende a ferramentas manuais comuns. Chaves de torque e medidores de vibração estão entre os dispositivos que devem ser calibrados em intervalos regulares. Acessórios, como cabos de teste e conectores, também devem ser cuidadosamente inspecionados antes do uso.

Para acomodar a amplitude dos equipamentos de comunicação, navegação e vigilância que devem ser verificados, os conjuntos de teste de linha de voo com capacidade multifuncional minimizam a quantidade de ferramentas e simplificam os requisitos de treinamento técnicos. A conectividade na nuvem também é um recurso valioso que permite que os fluxos de trabalho sejam adaptados em tempo real com base na atualização dos manuais ou de requisitos regulatórios globais.

Acopladores de antenas de transponder, testadores de capacitância de combustível e testadores de altímetro são soluções de teste portáteis adicionais projetadas para garantir um alto grau de aeronavegabilidade em solo.

Melhores práticas a serem consideradas

Esses fatores mostram que devolver um avião ao serviço é um processo complicado e demorado. Com o imenso volume de aeronaves armazenadas e a diversidade de modelos, ambientes e durações de armazenamento, mesmo a adesão rigorosa aos protocolos de manutenção no armazenamento não garante um retorno seguro e bem-sucedido aos ares.

O foco em pessoas, processos, equipamentos e ferramentas é uma maneira eficaz de mitigar o retorno à complexidade do serviço e priorizar recursos.

Ou seja, o retorno bem-sucedido e seguro ao serviço só pode ser alcançado por meio de muito trabalho, paciência, integridade e atenção aos detalhes. Uma abordagem baseada em risco para os processos de manutenção pode resultar em listas esmagadoras de práticas de teste e inspeção, mas que muito contribui para a segurança e a confiabilidade.

Invariavelmente, isso aponta para importantes sistemas e equipamentos da aeronave e um kit de ferramentas de teste confiável para verificar seu desempenho.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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