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Confirmado que turbulência de Airbus A350 derrubou avião DA62 em Dubai

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Relatório emitido pela autoridade de investigação dos Emirados Árabes Unidos confirma que a queda do bimotor DA62 ocorreu por consequência da esteira de turbulência de um Airbus A350.

Avião Diamond DA62
Diamond DA62 – Imagem: Anna Zvereva [CC]

A Autoridade Geral de Aviação Civil (GCAA) dos Emirados Árabes Unidos emitiu recentemente seu relatório final sobre um acidente ocorrido em 16 de maio de 2019, no qual um avião bimotor Diamond DA62 caiu durante a aproximação no Aeroporto Internacional de Dubai, vitimando todos os quatro ocupantes a bordo.

Na ocasião, a aeronave pertencente ao Serviço de Calibração de Voo executava a aproximação cumprindo um procedimento de calibração da iluminação da pista de pouso 30L, quando o piloto perdeu o controle e a aeronave sofreu o acidente.

A aeronave voava atrás de um Airbus A350, que aproximava para a pista 30R, paralela à 30L, porém não muito afastada lateralmente. Tanto a característica da queda quanto imagens de uma câmera de segurança do aeroporto indicavam um provável caso de perda de controle induzida por esteira de turbulência.

Note na sequência de fotos a seguir que é possível ver o DA62 estável na primeira foto (no canto inferior direito), perdendo o controle na segunda e novamente estável na terceira após se recuperar da perda de controle (a pequena luz vermelha é a ponta da asa esquerda do DA62, enquanto a verde é a ponta da asa direita, ambas vistas de frente; a grande mancha branca é o farol do Airbus A350, bem mais próximo da câmera).

Aeronave perdendo e retomando o controle – Imagem: GCAA

Já na próxima sequência de fotos abaixo, note na primeira foto que o DA62 novamente perde o controle, porém a segunda foto já mostra a aeronave de cabeça para baixo no ar (as luzes vermelha e verde trocaram de posição).

Aeronave perdendo o controle por completo – Imagem: GCAA

O relatório descreve que a avaliação do local da queda mostrou que o bimotor Diamond atingiu o solo em alta velocidade, e na direção oposta à que estava voando.

Local da queda do DA62 – Imagem: GCAA

Dados sobre os pilotos

O comandante do voo possuía 52 anos de idade, licença de Piloto Comercial, e uma experiência de 3441 horas de voo, sendo 645 horas no tipo de aeronave que estava pilotando.

Ele foi descrito por companheiros de trabalho como altamente respeitado, com muita experiência, conhecimento e consciência de segurança. Estava sendo preparado para assumir o papel de piloto-chefe da organização, e era conhecido por desafiar copilotos às vezes, como uma técnica para melhorar seus conhecimentos e habilidades.

O copiloto tinha 26 anos de idade, licença de Piloto Comercial, experiência de 757 horas de voo, sendo 440 no tipo de aeronave.

Ele foi descrito como competente, consciente da segurança, mas reservado e necessitado de reafirmação. Ele se expressaria para manifestar preocupações se estivesse familiarizado e confortável com o outro membro da tripulação de voo. Já havia voado com o comandante em 28 missões e com o inspetor de voo em 36 missões.

Condições meteorológicas

No momento do acidente, a visibilidade horizontal e vertical eram boas, e a aproximação era feita visualmente, embora a aeronave possuísse sistema Garmin G1000 aprovado para pousos por instrumento.

O vento era fraco na altitude da perda de controle, cerca de 1000 pés (300 metros), com velocidade registrada de até 6 nós (3 m/s).

Comunicações

Apenas as conversas entre o piloto e o controle de tráfego aéreo foram recuperadas. A aeronave não era equipada com gravador de voz (CVR) para registrar as conversas a bordo, e também não foi possível recuperar as conversas de rádio entre os funcionários em voo e a equipe de solo, feitas em uma frequência específica.

A categoria da aeronave não exige a utilização de CVR ou gravador de dados de voo (FDR), portanto os dados de voo também não foram registrados.

Recuperação de Upset no DA62

Upset é o nome dado à situação em que uma aeronave perde o controle em voo. Para que um piloto esteja preparado para essa situação, existe o treinamento de Upset Recovery (Recuperação de Upset).

Segundo o relatório, após discussões com os pilotos de teste de voo da Diamond, a fabricante da aeronave informou que, se um piloto com experiência em Upset Recovery tentasse se recuperar de voo invertido em ar calmo, seria necessária uma altitude mínima acima do nível do solo de 1.800 pés a 2.000 pés.

Segundo a fabricante, a influência dos vórtices de turbulência do Airbus A350 na estabilidade e controle da aeronave na altitude registrada tornaram improvável uma recuperação.

Separação de tráfegos

Segundo o manual de operações da empresa operadora do DA62 acidentado, a separação a ser mantida entre uma aeronave categoria Heavy (Pesada), como o Airbus A350, voando à frente do Diamond, deve ser de no mínimo 8 milhas náuticas (14,8 km) para uma operação segura quanto à ocorrência de esteira de turbulência.

Segundo o relatório, o DA62 estava operando sob VFR (voo visual) e a tripulação aplicou sua própria separação ao tráfego que chegava à pista 30R ao lado, de acordo com as normas e práticas recomendadas da ICAO (Organização da Aviação Civil Internacional).

Devido à proximidade da pista 30L com a pista paralela operacional 30R, o Controle de Tráfego Aéreo (ATC) identificou previamente uma probabilidade de encontros intensos de esteira de turbulência e, consequentemente, aumentou os mínimos de separação para tráfego IFR mais leve que opera na pista 30L atrás de tipos de aeronaves mais pesadas na pista 30R.

Os mínimos de separação aumentados foram estabelecidos a 3 milhas náuticas acima do mínimo recomendado de separação de turbulência da ICAO. Além disso, o espaçamento entre as chegadas na pista 30R foi aumentado para acomodar lacunas para os voos de calibração.

A investigação observou as gravações de radar do voo de posicionamento para o aeroporto de Dubai e analisou todas as aproximações realizadas durante o voo de calibração.

As observações identificaram que, para as dez aproximações durante as quais a tripulação de voo aplicou sua própria separação sob voo VFR, a distância entre o DA62 e o tráfego aéreo precedente na pista paralela operacional foi repetidamente menos do que os mínimos de separação de esteira de turbulência definidos pelo ATC para voos IFR.

A observação também identificou que, exceto no voo de posicionamento, onde o DA62 permaneceu a 500 pés acima do percurso de voo da aeronave anterior pousando na pista 30R, em todos os demais o DA62 capturou o caminho de aproximação a uma altitude mais baixa em relação ao tráfego aéreo anterior na pista 30R. A diferença de altitude variou entre 200 e 900 pés abaixo da altitude da aeronave anterior.

Na abordagem durante a qual o acidente ocorreu, o A350 estava na final para pista 30R, e o DA62 seguiu o A350 a uma distância de 3,7 milhas náuticas. Ele entrou na aproximação a uma altitude de 1.300 a 1.400 pés, enquanto o A350 tinha passado por esse local no caminho de aproximação paralelo a uma altitude de 1.500 a 1.600 pés, 90 segundos antes.

Avisos do controlador de voo

De acordo com o relatório, uma troca de funcionários do ATC ocorreu durante o voo de calibração, algum tempo após as cinco primeiras aproximações terem sido executadas.

O primeiro controlador de tráfego aéreo alimentou consistentemente o DA62 com informações de tráfego aéreo que incluíam possível esteira de turbulência em relação ao tráfego que fazia a aproximação à pista 30R.

O segundo controlador de tráfego aéreo também emitiu informações de tráfego aéreo, mas omitiu qualquer advertência sobre possíveis esteiras de turbulência de outro tráfego da pista 30R.

Pessoas da empresa que estavam familiarizadas com a rotina de voo do comandante disseram, com base nas comunicações de rádio e nas manobras da aeronave, que o comandante foi, provavelmente, o piloto no controle do DA62 durante toda a missão de calibração.

A aproximação do Airbus A350

A aeronave anterior ao DA62 era um Airbus A350-900 com um peso de 176,8 toneladas e uma envergadura de 65 metros. Ele executou uma aproximação de precisão sem intercorrências e pousou na pista 30R.

Airbus A350

De acordo com os dados recuperados do gravador de acesso rápido e disponibilizados à investigação, a tripulação do A350 aplicou a técnica de ‘decelerate approach’. O A350 desacelerou de 190 nós a 2.500 pés para uma velocidade de aproximação de 138 nós a 750 pés.

A configuração dos slats / flaps foi selecionada em ‘3’ quando a aeronave estava a 1.800 pés. O piloto automático foi desativado a 580 pés.

O gravador de acesso rápido registrou um componente de vento transversal pelo lado direito de até 9 nós na altitude de 2.200 pés, mas que caiu para 6 nós em altitudes entre 1.100 e 500 pés.

Esteiras de turbulência

A turbulência na esteira de uma aeronave é geralmente causada por vórtices na ponta da asa, que são uma consequência da pressão diferencial entre as superfícies inferior e superior da asa.

A pressão diferencial faz com que o ar se mova para fora na superfície inferior, produzindo vórtices cilíndricos no sentido anti-horário na asa direita e rotações no sentido horário na asa esquerda, olhando-se na direção do voo.

Vórtice de esteira de turbulência – Fonte: FAA

A força do vórtice depende principalmente do peso, velocidade, design da asa e configuração da asa. Geralmente, a força de um vórtice aumenta com o aumento do peso da aeronave e/ou com a diminuição da velocidade.

Os vórtices normalmente descem lentamente e se movem para fora quando em contato com o solo. Eles podem persistir por até três minutos e têm maior probabilidade de persistir com ventos de velocidade mais baixa.

Vórtice de esteira de turbulência – Fonte: FAA

Em particular, em condições de vento cruzado, semelhantes às condições no momento do acidente, ambos os vórtices podem de deslocar a uma certa distância lateral à trajetória de voo.

Uma Circular da FAA recomenda que: “Os pilotos devem voar no mesmo nível ou acima do percurso da aeronave precedente, alterando o curso conforme necessário, para evitar a área atrás e abaixo da aeronave geradora.”

Perda de controle

A Investigação considerou vários cenários com potencial de causar a perda de controle registrada pela câmera de aproximação da pista. Não havia indicação de que a aeronave tivesse encontrado um defeito em seus controles de voo ou uma falha estrutural antes do impacto.

A tripulação de voo não comunicou nenhuma emergência durante a perda de controle ou em qualquer outro momento, indicando que este foi um evento repentino inesperado que exigiu toda a sua atenção na tentativa de recuperar o controle da aeronave.

A aeronave tinha combustível suficiente a bordo, conforme registro de combustível, e não havia nenhuma indicação de que os motores pararam de produzir potência.

Causas do acidente

O Setor de Investigação de Acidentes Aéreos dos Emirados Árabes Unidos determina que o acidente ocorreu devido a uma perda de controle em voo durante a aproximação à pista 30L, causada por um encontro com vórtices de turbulência gerados por uma aeronave Airbus A350-900 anterior, que voava a cerca de 3,7 milhas náuticas e 90 segundos à frente do DA62 na aproximação à outra pista.

Fatores Contribuintes

A investigação identificou que a decisão do comandante, de reduzir a separação do tráfego aéreo precedente em aproximação à pista 30R, e as condições de vento, nas quais os vórtices se deslocaram a partir do caminho de aproximação da pista 30R atravessando o caminho de aproximação para a pista 30L, foram fatores contribuintes para o acidente.

Adicionalmente, destaca que o operador não possuía um sistema de gerenciamento de segurança eficaz, o que impedia a identificação de riscos operacionais durante voos de calibração, em particular, voos de calibração realizados nos aeroportos quando há mais de uma pista em operação.

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