Entenda o que ocorreu na arremetida sem potência do Embraer 195 na Áustria

Embraer 195, igual ao envolvido no incidente – Imagem: Transport Pixels / CC BY 2.0, via Wikimedia Commons

Um incidente envolvendo um jato brasileiro Embraer 195 durante um procedimento de arremetida na Áustria teve seu relatório final divulgado pela Autoridade de Investigação do país (SUB), apresentando detalhes sobre como tudo aconteceu. Acompanhe a seguir.

O incidente

Segundo o portal The Aviation Herald, o SUB descreveu a sequência de eventos informando que no dia 27 de outubro de 2017 a aeronave da companhia aérea Austrian Airlines, registrada sob a matrícula OE-LWJ, estava fazendo a aproximação final ILS (Sistema de Pouso por Instrumentos) para a pista 15 de Salzburg quando, cerca de 2,3 milhas náuticas (4,2 km) antes da cabeceira da pista, um alerta de windshear (vento cortante, ou cisalhante) foi acionado.

O piloto que estava voando o jato decidiu arremeter e realizar uma manobra de escape de windshear, porém, não ativou nenhum dos botões de TOGA (Take-off / Go Around, ou Decolagem / Arremetida).

Como resultado, o sistema autothrust (controle automático de potência) reduziu o empuxo dos motores de volta à condição anterior enquanto o piloto comandava a elevação do nariz do avião na arremetida.

Na sequência, devido ao alto ângulo de inclinação do nariz e à redução da velocidade por conta da potência reduzida, um aviso de estol (perda de sustentação) foi ativado. O sistema autothrottle permaneceu em modo de velocidade apesar do aviso de estol, portanto, apenas uma subida muito rasa foi alcançada durante os primeiros 73 segundos da manobra de arremetida.

Apenas 73 segundos após o aviso de windshear, os botões de TOGA foram pressionados, permitindo uma subida normal. A aeronave posteriormente pousou com segurança na pista 15.

Análise do SUB

No relatório factual, o SUB afirmou que, ao iniciar a arremetida, o piloto que estava voando o Embraer 195 empurrou as alavancas de empuxo para frente em cerca de 75 graus TLA (ângulo da alavanca de empuxo), mas então removeu sua mão direita das alavancas enquanto puxava o manche com ambas as mãos. Ambos os pilotos declararam que presumiram que as alavancas de empuxo haviam sido avançadas o suficiente, e que o TOGA havia sido ativado.

No entanto, nenhuma das condições foi atendida, portanto, o autothrust não ativou o sistema automático de controle de empuxo para potência de decolagem / arremetida e permaneceu no modo de velocidade, para manter 133 KIAS (133 nós de velocidade em relação ao ar).

Com o ângulo de inclinação do avião aumentado para 14 graus, a velocidade no ar reduziu-se para 113 KIAS, resultando em um aviso de estol sendo ativado durante 2 segundos.

A altura mínima foi de 650 pés sobre o solo (198 metros) cerca de 4 segundos após o aviso de windshear, e a velocidade mínima de 113 KIAS foi alcançada 11 segundos após o aviso de vento.

O relatório não deixa explícito quem era o piloto voando e quem era o piloto monitorando, no entanto, segundo o The Aviation Herald, o contexto sugere que o comandante era o piloto voando e o primeiro oficial era o piloto em monitoramento. Um piloto-aluno ocupava o assento de observador na cabine.

O SUB analisou que o sistema de controle automático teria entrado no modo de empuxo de decolagem / arremetida se as alavancas tivessem avançado para 78 graus ou mais, o que, entretanto, não foi alcançado. Com o ângulo de 75 graus, o sistema permaneceu em espera.

A ativação do botão de TOGA teria acelerado os motores para 87,4% N1 (velocidade de rotação da seção de baixa pressão do motor), bem como, diante do alerta de windshear ativo, a ativação do TOGA também teria ativado o modo de escape de windshear. Como resultado, não apenas os motores não atingiram o empuxo de TOGA, como as indicações do Diretor de Voo no painel não mudaram conforme necessário para a arremetida.

Efeito susto

O SUB descreve que é provável que o piloto voando não ativou o TOGA como resultado dos efeitos de surpresa e susto, tanto devido ao aviso de windshear quanto da posterior ativação do aviso de estol. O piloto em monitoramento também não verificou se o TOGA foi ativado.

A restrição mental devido ao efeito de susto causou a omissão de medidas de resolução de problemas e levou a aeronave a um estol, o que era, de longe, o maior risco para a aeronave naquele momento.

No entanto, o tempo de reação de ambos os tripulantes até que as medidas corretas (TOGA) fossem tomadas está dentro do intervalo de tempo esperado. Testes identificaram que o efeito de susto pode prejudicar a reação dos humanos para resolver problemas aritméticos por cerca de 30 a 60 segundos.

Causas prováveis e fatores contribuintes

O relatório conclui que as causas prováveis do grave incidente foram:

– desvios dos procedimentos operacionais padrão pela tripulação como resultado de efeitos de “surpresa e susto”;

– reação e ativação do TOGA tardias.

Como prováveis fatores contribuintes, o relatório indica:

windshear, com componentes variados de cauda;

– tempestade nas proximidades do aeródromo.

Com informações do SUB via The Aviation Herald

Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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