Gol tem nota de crédito revisada pela Fitch Ratings após reestruturação da dívida

A Fitch Ratings rebaixou os IDRs (Issuer Default Ratings – Ratings de Inadimplência do Emissor) de Longo Prazo em Moedas Estrangeira e Local da Gol Linhas Aéreas Inteligentes S.A. (Gol) para ‘RD’, de ‘C’, após a reestruturação de sua dívida, que a Fitch considerou como uma DDE (Distressed Debt Exchange – troca de dívida em situação crítica). Simultaneamente, a agência elevou os IDRs da empresa para ‘CCC+’, para refletir seu perfil de risco de crédito pós-reestruturação.

Além disso, rebaixou o rating das notas sem garantias da Gol Finance Inc. para ‘RD’, de ‘C’, bem como o Rating Nacional de Longo Prazo da Gol para ‘RD(bra)’, de ‘C(bra)’. Ao mesmo tempo, a Fitch elevou o rating das notas sem garantias da Gol para ‘CCC/RR5’, de ‘RD’, bem como o Rating Nacional de Longo Prazo da empresa para ‘CCC(bra)’, de ‘RD(bra)’.

Principais Fundamentos

Transação Classificada Como DDE: A Gol concluiu uma emissão de notas seniores com garantias, no montante de USD1,4 bilhão e com vencimento em 2028, para a Abra Group Limited (Abra), uma nova holding criada para controlar as operações da Gol e da Avianca Group International Limited (Avianca).

A Gol contribuiu com cerca de USD1,077 bilhão em valor nominal de suas notas com desconto ao par de USD312,6 milhões (USD764 milhões), e a Abra concordou em desembolsar, até 2028, recursos adicionais de até USD451 milhões. A emissão tem como garantia de primeiro grau os direitos de propriedade intelectual e a marca do programa de fidelidade Smiles, bem como os direitos de propriedade intelectual, da marca e das peças de reposição da Gol. A Abra tem a opção de solicitar que estas notas com garantias sejam substituídas por notas seniores conversíveis com garantias e com vencimento em 2028.

A operação foi classificada como DDE de acordo com a metodologia da Fitch, pois os detentores de títulos que aceitaram a transação tiveram desconto (haircut) em seus títulos (83% para títulos com vencimento em 2024, 47% para os com vencimento em 2025, 61% para os com vencimento em 2026 e 10% para as notas perpétuas).

Os detentores de notas que não aceitaram o acordo também obtiveram redução significativa nos termos das notas existentes, em virtude da eliminação de alguns covenants restritivos, bem como da subordinação estrutural. Excluindo os arrendamentos, a dívida com garantias representará cerca de 66% da dívida total da Gol, em comparação com 18% antes desta transação.

As atuais emissões da companhia em circulação no mercado, além das notas seniores com garantias e vencimento em 2028, incluem USD70 milhões em notas seniores conversíveis e com vencimento em 2024; USD341 milhões em notas sem garantias e com vencimento em 2025; USD251 milhões em notas com vencimento em 2026 e USD138 milhões em notas perpétuas.

Maior Flexibilidade Financeira: Apesar de não resultar em impactos significativos em termos de estrutura de capital e de apresentar elevadas taxas de juros, a operação melhora a flexibilidade financeira da Gol. A empresa garantiu o acesso a uma nova linha de crédito, reduzindo os riscos de refinanciamento para o período de 2024 a 2026 e as saídas de juros no médio prazo (capitalizados).

A Gol tem acesso a USD451 milhões em novos recursos, que podem ser utilizados para fins corporativos gerais, incluindo o pagamento antecipado de dívidas, necessidades de capital de giro ou investimentos. Em base pro forma, esta nova linha de crédito aumenta a posição de liquidez da Gol e cobre as amortizações da dívida financeira até meados de 2025 (pro forma e excluindo pagamentos de arrendamentos).

No quarto trimestre de 2022, a companhia emitiu USD200 milhões em notas com remuneração (Secured Amortizing Notes), que foram utilizados para estender operações diferidas de arrendamento por mais um ano, até 2026, e reduzir os desembolsos em 2023.

Operações Devem Melhorar em 2023: Os sólidos volumes de tráfego de passageiros no Brasil, a eliminação dos impostos PIS/Cofins, a redução nos preços dos combustíveis e melhoras na estrutura de custos, incluindo a otimização da frota, devem continuar impulsionando a recuperação do fluxo de caixa operacional da Gol em 2023. A Fitch acredita que o EBITDA ajustado da empresa atingirá BRL4,6 bilhões este ano, em comparação com BRL2,9 bilhões em 2022.

O aumento nos preços dos combustíveis (de 68%) no ano passado foi apenas parcialmente compensado pelo aumento substancial dos yields (47%). A estratégia de gestão de yields tem sido sustentada pela demanda reprimida após a pandemia de coronavírus, bem como pela forte retomada na demanda por tráfego corporativo. A demanda do mercado doméstico brasileiro se recuperou, com o tráfego de passageiros em 2022 apenas 7% abaixo do período anterior à pandemia (2019).

O posicionamento mais racional das três maiores empresas do mercado nacional, com foco em rentabilidade, tem sido fundamental para a recuperação do setor. Em um cenário de aumento de capacidade de algumas empresas, normalização dos volumes de tráfego e cenário macroeconômico mais desafiador, os yields poderão sofrer deterioração ao longo de 2023. No entanto, a Fitch acredita que estes indicadores permanecerão em patamares adequados.

Investimentos Devem Pressionar o FCF: A Gol permanece com o desafio de melhorar sua geração de fluxo de caixa operacional para enfrentar o cenário de aumento das taxas de juros e suas despesas com arrendamentos, enquanto sustenta investimentos crescentes na renovação de sua frota. De acordo com os cálculos da Fitch, a empresa gerou fluxo de caixa operacional (CFFO) positivo no quarto trimestre de 2022, pela primeira vez desde a pandemia.

O CFFO foi de BRL252 milhões, após o pagamento de BRL236 milhões em juros e BRL731 milhões em obrigações de arrendamento no trimestre. Em 2023 e 2024, a Fitch estima que o fluxo de caixa livre (FCF) da Gol ficará negativo em BRL1,6 bilhão e em BRL1,1 bilhão, considerando BRL2,5 bilhões e BRL2,0 bilhões em investimentos, respectivamente. Em 2022, o FCF ficou positivo em BRL226 milhões, após BRL857 milhões em investimentos. Pelas projeções da agência, os índices de alavancagem total e líquida da Gol — de acordo com a metodologia da Fitch — ficarão em torno de 5,9 vezes e 5,3 vezes em 2023 e em 5,2 vezes e 4,8 vezes em 2024.

Boa Posição de Mercado: A Gol detém posição de liderança no mercado brasileiro de aviação, o que a Fitch considera sustentável a médio prazo, com participação de mercado em torno de 34% em 2022, medida pelo RPK (Revenue Passenger‐Kilometers ou passageiros‐quilômetros pagos transportados). Como o Brasil é o principal mercado da empresa, os resultados operacionais da Gol estão altamente correlacionados com a economia local.

A Fitch avalia a Gol em base individual, e não incorporou à análise quaisquer novos desdobramentos relacionados à criação da Abra, além da recente reestruturação da dívida. No entender da agência, pode haver oportunidade de redução de custos sob uma estrutura de grupo em um horizonte de médio a longo prazos. A Gol e a Avianca devem continuar operando de forma independente e mantendo suas respectivas marcas.

O relatório completo pode ser lido no site da Fitch Ratings.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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