NASA está ‘espremendo’ motores de aviões para deixá-los mais estreitos do que já são

Motor turbofan – Imagem: GE Aviation

Embora os mais recentes motores dos aviões comerciais tenham enormes diâmetros, quem já teve a oportunidade de chegar perto de um deles notou que a maior parte dessa dimensão é um grande “vazio”, em que passa apenas ar, enquanto o motor propriamente dito é bastante estreito e fica apenas na região central (na imagem acima, por exemplo, note o tamanho da parte frontal e o quanto é menor o final do motor).

E é nessa característica que a Administração Nacional Aeronáutica e Espacial dos Estados Unidos (NASA, na sigla em inglês) está trabalhando para projetar um novo motor a jato que, comparado aos motores atuais, produzirá o mesmo empuxo e até terá a mesma aparência externa, mas será mais eficiente em termos de consumo de combustível.

O HyTEC, ou Hybrid Thermally Efficient Core (ou Núcleo Híbrido Termicamente Eficiente), é um projeto da NASA iniciado em junho de 2021 que busca tornar a indústria da aviação mais sustentável, desenvolvendo um núcleo menor para um motor a jato turbofan, que aumenta a eficiência do uso do combustível.

O projeto também inclui trabalho de hibridização – desenvolvimento de métodos para extrair mais energia elétrica deste motor para alimentar outros sistemas a bordo da aeronave, o que poderia aumentar a eficiência de combustível da mesma forma que um carro híbrido faz.

Assim que essas tecnologias verdes forem demonstradas e comprovadas, o objetivo do HyTEC é tê-las prontamente disponíveis para adoção pelo setor de aviação na próxima década.

“O que estamos tentando fazer na NASA é impulsionar mais tecnologias de propulsão sustentável de próxima geração em motores a jato usando nossa experiência e financiamento exclusivos”, disse Anthony Nerone, que lidera o projeto HyTEC do Centro de Pesquisa Glenn da NASA em Cleveland. “Com o motor de núcleo pequeno em específico, estamos visando uma redução de 5 a 10% no consumo de combustível.”

Motores a Jato

Imagem: NASA

Para explicar melhor o que o projeto HyTEC está fazendo para tornar os motores a jato turbofan mais eficientes, uma rápida atualização sobre como eles funcionam pode ser útil.

Girando bem na frente do motor está o fan (ventilador), que puxa continuamente uma grande quantidade de ar para dentro do motor. O fan gera a maior parte do empuxo que move o avião para frente.

Parte do ar recolhido pelo fan, no entanto, flui para pelo centro, por sua fonte de energia – o núcleo do motor, que contém a turbina. Esta característica define um motor turbofan.

A primeira parada no núcleo é um componente chamado compressor (HPC na imagem acima). O compressor é composto de muitas pequenas lâminas em discos giratórios. Ele espreme o ar – semelhante a como você pode espremer o ar dentro de uma seringa vazia com o bico tampado. Isso aumenta a pressão do ar no núcleo do motor.

O ar comprimido passa ao combustor, também conhecido como câmara de combustão. Aqui, o combustível é adicionado ao ar comprimido e a mistura é inflamada. O calor adicionado por essa explosão aumenta ainda mais a pressão do ar, já que o calor se expande.

O ar comprimido, aquecido e expandido passa por mais uma seção antes de sair do motor. As lâminas dos discos giratórios da turbina (HPT na imagem acima). Localizada perto da parte traseira do motor, ela extrai a energia do ar de alta pressão e temperatura para manter o fan girando la na frente e puxando mais ar.

Finalmente, o ar sai pelo bocal – a extremidade traseira do motor a jato.

Ao expandir rapidamente o ar dessa maneira, o núcleo do motor aumenta o empuxo do fan, necessário para empurrar o avião para frente.

Ao longo do caminho, a energia gerada pelos componentes giratórios no núcleo do motor também é usada para carregar os componentes elétricos da aeronave, semelhante à forma como a bateria do carro é recarregada durante o funcionamento do motor.

A alta tecnologia do HyTEC

A chave para o trabalho do HyTEC é o que se chama de taxa de desvio (baypass). Esta é a proporção de quanto ar o fan empurra por fora do núcleo versus quanto entra no núcleo do motor para fazer girar o próprio fan.

Por exemplo, os motores GE usados ​​atualmente no Boeing 787 Dreamliner têm uma taxa de desvio de 9. Isso significa que nove vezes mais ar desvia do núcleo do motor como empuxo em vez de entrar no núcleo. O novo motor da GE para o Boeing 777-9 fica por volta de 10.

O HyTEC está trabalhando para aumentar drasticamente essa taxa de desvio. O projeto visa criar um motor com uma taxa de desvio de 15, mantendo o fan do mesmo tamanho enquanto “espreme” o núcleo do motor – tudo isso mantendo o mesmo nível de empuxo.

Comparação entre os tamanhos de um componente de um motor atual de do futuro HyTEC – Imagem: NASA

Para manter o mesmo nível de empuxo de um núcleo menor, no entanto, a pressão e a temperatura do ar que é empurrado para o núcleo aumenta. Este núcleo menor e mais eficiente, alimentando um fan de tamanho igual, fornecerá o mesmo empuxo usando menos combustível.

Como os materiais atualmente usados ​​na construção do motor não podem suportar o aumento da pressão e do calor, o projeto está desenvolvendo materiais de construção mais novos e mais duráveis, como compósitos de matriz cerâmica com revestimentos de barreira que os protegem das condições extremas.

Esses materiais devem ser testados e comprovados em laboratório. Pesquisadores estão atualmente trabalhando nos laboratórios de materiais da NASA Glenn e nas instalações dos parceiros para garantir que os materiais em potencial possam suportar o calor e a pressão e sejam suficientemente duráveis.

Mas não é só isso. Com um núcleo de motor menor, aspectos como proporções e dimensões de projeto ou aerodinâmica mudam, causando penalidades de eficiência. Para manter o desempenho enquanto reduz o tamanho, novas inovações e projetos de tecnologia precisam ser investigados e testados.

Depois que esses componentes forem demonstrados, a equipe HyTEC trabalhará com parceiros do setor para construir um pequeno núcleo totalmente operacional e executá-lo em seu ritmo. Durante esta fase, eles examinarão quanto mais energia elétrica pode ser extraída do motor de núcleo pequeno, o que também aumenta a eficiência de combustível do motor, tornando-o mais híbrido.

“No momento, o motor mais eletrificado é o do Boeing 787 Dreamliner, e esse motor fornece 5% de sua potência à eletricidade. Queremos saltar para 10 a 20%. Isso é 2 a 4 vezes mais energia elétrica”, disse Nerone.

Essa energia elétrica pode ser usada de várias maneiras – desde alimentar sistemas elétricos a bordo da aeronave até adicionar tecnologia híbrida aos próprios motores a jato, aumentando a potência durante o voo.

Um novo motor para uma nova frota

Uma vez que o HyTEC demonstre um pequeno núcleo totalmente operacional que prove que toda a tecnologia funciona em conjunto, cabe aos parceiros da indústria da NASA assumir a liderança.

O plano da NASA é colaborar com as empresas de motores para disponibilizar tecnologias de núcleo pequeno muito mais cedo do que o planejado, para que os fabricantes de motores a jato possam ter o núcleo pronto para uso em frotas de aviação em meados da década de 2030.

A essa altura, espera-se que tecnologias de aviação ainda mais sustentáveis ​​estejam entrando no mercado. O objetivo do HyTEC é desenvolver o motor de núcleo pequeno, mas a NASA também tem outros objetivos.

“Os novos núcleos do motor são projetados para economizar de 5 a 10% em combustível, mas combinados com outras iniciativas podem aumentar ainda mais essa economia de combustível”, disse Nerone.

A quantidade de trabalho que o HyTEC está se preparando para concluir em seu cronograma é uma meta ambiciosa, mas a equipe está à altura da tarefa.

“Desde que montamos uma equipe e dissemos ‘olha, é isso que temos que fazer neste período de tempo’, todo mundo se esforçou e fez sua parte”, disse Nerone. “É um testemunho para o pessoal da NASA e todos que trabalham no HyTEC. Nós temos as pessoas. Nós temos o talento. Nós podemos fazer isso.”

Informações da NASA

Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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