Passageiras retiradas de avião para vistoria nas partes íntimas processam empresa aérea

Avião Airbus A350-1000 Qatar Airways
Imagem: Pedant01 / CC BY-SA 4.0, via Wikimedia

Há exatamente um ano, um escândalo tomava conta do aeroporto internacional de Doha, quando um bebê recém-nascido foi encontrado abandonado num banheiro, próximo ao portão de embarque de onde partiria um voo para Sydney. Após a descoberta do bebê, imediatamente uma investigação foi iniciada.

No processo, enquanto buscavam pela mulher que deu à luz e abandonou seu filho, oficiais do Qatar retiraram mulheres de voos, em especial treze daquele rumo à Austrália, para um exame vaginal invasivo ali mesmo, numa ambulância estacionada ao lado do avião, no pátio do aeroporto.

Eis que, recentemente, se tornou conhecido que sete das treze mulheres australianas que foram retiradas daquele voo, entraram com um processo contra a companhia aérea estatal do Catar e a Autoridade de Aviação Civil daquele país, acusando-os de agressão e privação de liberdade. O processo ocorre depois que a Qatar Airways supostamente se recusou a se encontrar com as vítimas.

O caso

As mulheres estavam viajando de volta para a Austrália no voo QR-902 da Qatar Airways, que havia sido aprovado em meio à pandemia pelas autoridades australianas. O voo não estava lotado, mas o que era para ser um voo de volta para casa, tornou contornos estranhos.

Primeiro, o voo foi impedido de partir. Os passageiros ficaram esperando a bordo do avião por quatro horas sem nenhuma explicação da equipe antes que todas as mulheres fossem retiradas da aeronave por guardas armados vestidos de preto.

“Havia uma mensagem no alto-falante dizendo: ‘todas as mulheres devem desembarcar do avião com seus passaportes’”, explicou Sophie, uma das vítimas que descreveu como os passageiros ficaram em estado de choque e tentando obter mais informações da tripulação de cabine.

Outra vítima, conhecida apenas como Jane, temia que algo muito errado estivesse para acontecer. “Os policiais estavam vindo no avião e eles tinham armas e coisas assim. Não sabia se era uma situação de reféns, se era uma situação de terrorismo ”, disse ela ao 60 Minutes.

Ambulâncias

Em seguida, as 13 mulheres foram conduzidas para um elevador e descidas para a pista onde várias ambulâncias aguardavam. Ainda sem saber o que realmente estava acontecendo, as mulheres foram conduzidas uma a uma para as ambulâncias.

“Entrei na ambulância e havia uma mulher lá dentro e tudo o que ela disse foi esta única linha:‘ um bebê foi encontrado em uma lixeira e precisamos testar você ’”, explicou Jane.

Os policiais acreditavam que a mãe era uma passageira, então um plano foi traçado para revistar as mulheres em idade reprodutiva. Não se sabe quantas mulheres no total foram submetidas a exames vaginais forçados, mas a Human Rights Watch estima que as mulheres foram retiradas de cerca de 10 voos diferentes.

Depois de entrar na ambulância, Sophie recebeu ordem de se deitar. “Ela me perguntou se eu poderia me deitar na mesa. Eu estava deitada ali pensando ‘Não sei o que vai acontecer comigo’. E ela apenas me perguntou: ‘precisamos tirar suas calças’. E eu me lembro de pensar que isso é bizarro. “

Ela inicialmente se recusou a abaixar sua calcinha, apesar da enfermeira insistir que ela tinha que fazer.

Anna já havia começado a ficar chateada antes mesmo de chegar à ambulância. “Pensei que já estivéssemos raptados. Foi o momento mais assustador da minha vida”, ela contou, detalhando o momento em que uma enfermeira tirou sua calcinha à força na presença de seu filho de cinco meses.

Eventos posteriores

Após o incidente, algumas das mulheres contataram a Polícia Federal Australiana (AFP) e o assunto ganhou as manchetes em todo o mundo. A Austrália e a União Europeia repudiaram a atitude do Catar nos dias que se seguiram á agressão, mas ficou apenas nisso.

O primeiro-ministro e ministro do Interior do Catar, Xeque Khalid bin Khalifa bin Abdulaziz Al Thani, acabou se desculpando pelo que aconteceu com as mulheres e jurou ação legal contra os responsáveis. A culpa foi atribuída a um policial que recebeu pena de prisão.

A ação judicial

A chance de uma ação judicial como essa prosperar é pequena, mas as mulheres estão dispostas a seguitrem até o fim.

“O incidente violou muitos tratados internacionais e obviamente violou os direitos humanos”, explicou Damian Strurzaker, advogado do escritório de advocacia Marque, com sede em Sydney, que representa algumas das vítimas. “Queremos um resultado razoável e que medidas positivas sejam tomadas para garantir a segurança das mulheres e, em geral, das pessoas que viajam por Doha”, continuou ele.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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