Piloto conta como foi fazer um voo atípico e descobrir pela mídia a importância da missão

Comandantes Joe Dennett e Steve Mutch com Nazanin e Anoosheh – Imagem: Titan Airways

A companhia britânica Titan Airways já é bastante conhecida por oferecer, por mais de 30 anos, serviços de voos fretados e alugueis de aeronaves para necessidades de seus clientes.

Mais do que isso, ela até mesmo tem um histórico de uso de seus jatos para algumas missões especiais, como pousos no crítico aeroporto da ilha de Santa Helena, no meio do Oceano Atlântico, ou na pista de gelo de uma base de pesquisa na Antártica.

Avião Boeing 757-200 Titan Airways
Boeing 757-200, um dos jatos da frota da Titan – Imagem: RHL Images from England / CC BY-SA

E agora, a Titan apresenta o testemunho de um de seus comandantes, que é também o gerente de frota da companhia, sobre uma curiosa missão praticamente misteriosa, contratada pelo governo britânico, em que ele e sua equipe acabaram ficando sabendo de certos aspectos do voo primeiro pela imprensa do que pela própria chegada de informação da empresa.

Acompanhe a seguir o interessante texto do comandante Steve Mutch.

“Não existe um “dia típico” na Titan, tamanha é a variedade do que fazemos. Mas alguns dias são mais atípicos do que outros.

O dia em que levamos Nazanin Zaghari-Ratcliffe e Anoosheh Ashoori para casa depois de seus respectivos exílios no Irã foi certamente aquele que ficará na memória por muito tempo.

Após o contato inicial do governo perguntando se poderíamos ficar preparados para um voo VIP especial, as horas e dias anteriores foram pontuados pela incerteza. Inicialmente, pensamos que estaríamos voando para o próprio Irã. Estávamos quase prontos para partir no dia anterior, mas fomos ainda mantidos em posição.

Estamos indo embora? Estamos ficando? O jogo de espera constante de “vai-não vai” é algo com o qual você se acostuma nesta linha de trabalho!

Mesmo no dia seguinte, de uniforme, esperando para sair do hotel, não tínhamos certeza do que estava acontecendo. Mas, finalmente, estávamos no ar.

Foi decidido que iríamos buscar Nazanin e Anoosheh em Muscat, no vizinho Omã. Acho que foi enquanto estávamos em Muscat que começamos a ver alguns relatos na mídia do Reino Unido sobre a libertação deles e o retorno iminente.

É uma posição um pouco surreal as notícias alcançando você ainda no lugar onde está cumprindo a missão e você procurando de onde virá a próxima atualização: da mídia ou da Titan. Você sente tudo isso acontecendo ao seu redor com uma sensação, não necessariamente de perigo, mas de incerteza, dada a precariedade da situação mais ampla.

E então, depois de toda a preparação, finalmente tivemos Nazanin e Anoosheh a bordo, prontos para levá-los para suas famílias.

O voo de volta foi outra sensação surreal. Pilotar um grande avião com um punhado de passageiros é incomum de qualquer maneira, mas parecia ainda mais bizarro dadas as circunstâncias, e isso continuou quando pousamos em na base aérea de Brize Norton, em Oxfordshire.

Era cedo, por volta das 2 horas da manhã. Esperávamos que fosse bastante secreto e discreto, mas fomos recebidos por fotógrafos da imprensa; a Secretária de Relações Exteriores, Liz Truss, estava lá para cumprimentar Nazanin e Anoosheh.

Acho que naquele momento, vendo a recepção, todos percebemos que fizemos algo de real benefício aqui. Você se acostuma a fazer coisas emocionantes, seja voar com David Cameron ou pousar na Antártica. Mas a magnitude da cobertura que veio com este voo foi um choque muito agradável e um lembrete da importância do que fazemos.

Steve Mutch, Comandante e Gerente de Frota”

Nazanin Zaghari-Ratcliffe, nascida em 26 de dezembro de 1978, é uma cidadã iraniano-britânico com dupla cidadania que foi detida no Irã a partir de 3 de abril de 2016, como parte de uma longa disputa entre a Grã-Bretanha e o Irã. No início de setembro de 2016, ela foi condenada a cinco anos de prisão depois de ser considerada culpada de supostamente “conspirar para derrubar o governo iraniano”.

Anoosheh Ashoori é um empresário iraniano-britânico que ficou detido na prisão de Evin, no Irã. As autoridades iranianas prenderam Ashoori em agosto de 2017, quando ele estava no país para visitar sua mãe. Em agosto de 2019, o judiciário iraniano condenou Ashoori a 12 anos de prisão, sendo 10 anos por supostamente “espionar para o Mossad de Israel” e dois anos por “adquirir riqueza ilegítima”, acusações que Ashoori nega.

Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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