Pilotos de 737 MAX se deparam com dispositivo “escondido” na cabine após Boeing enviar alerta

Os pilotos de 737 MAX nos EUA se depararam com um sistema até então desconhecido, após receberem um aviso da Boeing. Um boletim de segurança enviado pela fabricante para os pilotos da Southwest Airlines, após dois casos de colisão com pássaros no motor e subsequente fumaça na cabine, levou à descoberta.

A primeira ocorrência foi na decolagem de Havana, capital de Cuba, em março do ano passado, e a outra em Nova Orleans, na Lousiana, em dezembro de 2023. Em comum, nos dois casos, os pássaros atingiram em cheio o motor esquerdo, danificando várias palhetas do sistema de admissão e compressão de ar. Os detritos da colisão acabaram atingindo um cárter de óleo, gerando vazamento do líquido utilizado para lubrificação e refrigeração de vários componentes do motor.

Este óleo esquentou e entrou para o sistema de ar-condicionado e pressurização, que nos aviões a jato funciona a partir da “drenagem” de ar já comprimido pelos motores. Com isso, uma fumaça se formou na cabine de passageiros, complicando a situação já delicada de voar com um motor a menos durante a subida inicial.

Segundo o jornalista Dominic Gates, do Seattle Times, nesta situação os pilotos teriam que cumprir três checklists diferentes, aumentando a carga de trabalho e estresse. E a Boeing notou este excesso e orientou aos pilotos no boletim para que, caso uma situação similar ocorrer, onde o motor é atingido e em seguida surge fumaça a bordo, que o caso seja tratado como “dano severo do motor”, e o checklist apropriado seja seguido.

Neste caso, o procedimento é mais direto e rápido, e fala para o motor ser desligado e um extintor ser ativado se necessário. Com isso o motor iria parar de girar e a fumaça sumiria de maneira mais rápida.

Só que, ao ler o boletim, os pilotos notaram a descrição de um sistema até então desconhecido: o LRD, da sigla Load Reduction Device, ou dispositivo de redução de carga.

Este LRD é colocado no motor para que a vibração seja reduzida em caso de falha ou colisão externa, como foi o caso dos dois voos da Southwest no ano passado. O dispositivo irá desacoplar a fan (ventilador) primário do motor, responsável por admitir o ar, e irá deixá-lo girar livremente, sem estar acoplado aos eixos dos compressores e turbinas.

Divulgação – CFM

Rodando de maneira livre, o fan primário, que é o maior rotor do motor, não transmitirá a vibração para o eixo e nem a receberá, reduzindo a vibração da aeronave. O LRD foi implementado pela CFM, fabricante do motor LEAP, que equipa, além do 737 MAX, os jatos A319/A320/A321neo da Airbus e o C919 da chinesa COMAC.

O LRD não é opcional de fábrica e está presente em todos os motores CFM LEAP, assim como não é passível de controle pelos pilotos, já que funciona de maneira totalmente automatizada. O sistema já constava naturalmente no manual dos mecânicos.

Porém, os pilotos da American, United e Southwest se mostraram surpresos com o LRD não constar em seus manuais de treinamento e consulta, o que gerou reclamações. A Southwest já informou que irá incluir as informações sobre o dispositivo no manual para pilotos.

Esta desconfiança por parte dos tripulantes vem em decorrência dos dois acidentes com o 737 MAX, em 2018 e 2019, que foram causados pelo sistema de melhoria de manobras, o MCAS, que era desconhecido de todos os pilotos no mundo, mesmo sendo algo que interferia diretamente na pilotagem da aeronave.

A falta de informação sobre o MCAS foi um dos fatores que levou as tripulações a não saberem lidar com os problemas no voo da Lion Air e Ethiopian Airlines, e contribuiu para a morte de 346 pessoas.

A Boeing não comentou por que não informou aos pilotos sobre o LRD no passado e qual o papel no caso dos dois incidentes da Southwest com pássaros após a decolagem, e por que eles foram citados no boletim de segurança enviado para a companhia aérea e seus pilotos.

Já a Administração Federal de Aviação dos EUA, responsável por certificar os aviões e fiscalizar a Boeing, a CFM e as companhias aéreas, afirmou que não existe evidência de que os pilotos nos incidentes da Southwest foram de alguma forma levados a algum engano pelos sintomas do motor.

Foto – DepositPhotos

A CFM informou que “os pássaros que atingiram os motores dos 737 MAX da Southwest excederam o tamanho e peso necessários para certificação do motor LEAP, mas ainda assim o equipamento se comportou como o projetado para estes eventos”.

Por outro lado, o Comandante da American Airlines e representante sindical, Dennis Tajer, disse ao Seattle Times que “Enquanto a segurança do sistema de motores aparenta ser uma função necessária, continuaremos a procurar mais informações. Como isso impacta os indicativos dos motores durante uma falha com dano severo? E, por que o cárter falhou ao não conter o óleo?”, questiona o aviador.

A CFM ressaltou que este sistema também está presente nos grandes jatos Boeing 777 e 787 Dreamliner, equipados com os motores GE90 e GENX respectivamente. A CFM é uma joint-venture da General Eletric (GE) com a francesa Safran, e as três companhias compartilham tecnologias entre seus produtos.

Carlos Martins
Carlos Martins
Fascinado por aviões desde 1999, se formou em Aeronáutica estudando na Cal State Long Beach e Western Michigan University. #GoBroncos #GoBeach #2A

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