Preços de aeronaves ‘widebody’ estão sob grande pressão

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Os valores das aeronaves widebody (de corpo largo ou dois corredores) já estavam sob pressão antes da pandemia, quando 50% da frota mundial teve seus Valores de Mercado (MV) reduzidos em 5% do Valor Base (BV), mas o declínio em 2020 foi considerável. A motivação principal para isso é a expectativa de uma retomada lenta da aviação, com mais impacto para os voos internacionais de longa distância, onde esse tipo de aeronave é geralmente empregada.

Queda de valor

Atualmente, segundo dados da Cirium, empresa de inteligência de dados para a aviação, metade da frota está abaixo de 83% do Valor Base, embora, curiosamente, ao longo deste período de dois anos, cerca de um quinto da frota sempre tenha permanecido acima da Base, por causa da demanda por cargueiros no ano de 2020, em meio à pandemia.

Com base na média ponderada da frota, os valores de mercado dos modelos de tecnologia mais antiga (A330 e 777-300ER) caíram 20-30%, enquanto os novos (família 787 e A350) diminuíram 3-17% ao longo de 2020. Também incluído no gráfico está o pico e o vale de crises anteriores (2008 e 2010) para efeitos de comparação.

Se olharmos para 2021 e os impulsionadores fundamentais da oferta e demanda, parece que a oferta de aeronaves de passageiros aumentará ainda mais, enquanto a demanda permanece retraída, apontando para mais pressão sobre os valores e as taxas de arrendamento.

Espera-se que haja um grande excedente de aeronaves até meados da década de 2020, apesar de uma redução de 45% nas entregas da Airbus e Boeing em 2020. Sem demanda suficiente para absorvê-las, esperamos ver um aumento nas aposentadorias e conversões de passageiros para cargueiros. Apesar disso, 2020 registrou o menor número de aposentadorias desde 2009, sugerindo que as empresas mantiveram as aeronaves em armazenamento por enquanto, com uma possível onda de part-out começando em breve.

Frotas

O número de aeronaves armazenadas atingiu o pico em cerca de 14.400 ou 65% da frota global, mas desde então diminuiu e divergiu, com 28% das aeronaves de corredor único estacionadas, enquanto widebodies estão em 37%. 

As devoluções aos locadores, no entanto, devem permanecer em níveis muito altos. Os locadores estão tentando evitar devoluções não programadas por meio de extensões de prazo de arrendamento e renegociações de aluguel sempre que possível. 

Em janeiro de 2021, temos conhecimento de 61 companhias aéreas que entraram em processo de recuperação judicial ou tiveram sua liquidação concluída em 2020, representando mais de 1.400 aeronaves, um terço das quais encomendadas. Este pool de aeronaves em companhias aéreas falidas inclui 340 widebodies, 18 dos quais estão encomendados.

O número geral de falências em 2020 é relativamente pequeno, apesar do clima adverso. Isso se deve aos níveis sem precedentes de apoio financeiro dos governos para evitar o colapso das operadoras. Só quando esses pilares de sustentação forem removidos é que a verdadeira saúde de cada companhia aérea ficará clara.

O mercado widebody é, sem surpresa, muito menos líquido do que o mercado narrowbody, conforme ilustrado no segundo gráfico comparando a concentração da frota com o Boeing 737-800 (muito mais operadores). Embora as curvas sejam amplamente semelhantes até a marca de participação cumulativa de 50%, há uma divergência significativa depois, destacando o nível de concentração da frota de grandes aeronaves e a falta de mercado secundário para elas.

Antes do início da pandemia de Covid-19, havia uma tendência à colocação de aeronaves narrow body de longo alcance em rotas de médio curso em vez de widebodies. Essa tendência pode aumentar ainda mais à medida que as companhias aéreas procuram otimizar os ativos, tanto visando maximizar os fatores de carga quanto para reduzir os custos operacionais.

Modernos

O fator mais interessante a se prestar atenção em 2021 é o aumento na disponibilidade de aeronaves de nova tecnologia, especialmente o Boeing 787. Embora houvesse alguma disponibilidade desses tipos no início de 2020, o número geral era bastante baixo. 

A reestruturação da Norwegian levou ao inevitável fim de sua problemática rede de longa distância e, subsequentemente, seus 35 787 estão agora procurando novos lares. Isso se soma a outros 110 787 e A350 em companhias aéreas que estão em reestruturação, o que significa que poderemos ver novas quedas nos valores de mercado e nas taxas de aluguel, devido à natureza fraca da demanda. Isso poderia desafiar ainda mais os valores de mercado do A330 e do 777-300ER, que têm suas próprias ameaças de fornecimento adicional de companhias aéreas em dificuldades.

As companhias aéreas continuarão a tendência de 2020 de escolher operar o 787 e o A350 com sua economia superior em relação a seus antecessores, especialmente em vista dos preços mais altos dos combustíveis em comparação com o ano anterior. 

Comparando o número de voos rastreados entre meados de fevereiro de 2020 e o final de janeiro de 2021, vemos que a atividade do 787-9 caiu apenas 17%, enquanto o A330-300 e o 777-300ER caíram 57%. A recuperação na atividade de voos do A350-900 não foi tão forte e permanece 40% menor em comparação com o ano anterior. Isso pode ser devido à concentração de A350 na Ásia e às atuais restrições estritas às viagens internacionais na região.

Embora haja muitas maneiras de prever em que ano o tráfego de passageiros retornará aos níveis de 2019 (na opinião da Cirium, não antes de 2024), acreditamos que a recuperação de aeronaves de passageiros de corredor duplo ocorrerá cerca de 12 a 18 meses após a frota global de corredor único. Portanto, embora possa haver uma luz no fim do túnel para a indústria de aviação comercial, para o segmento de fuselagem larga podemos esperar mais dificuldades no ano que vem.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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