O severo impacto da pandemia no setor aéreo é inquestionável, dados da ANAC acusam que em abril de 2020 as variações RPK e ASK mensais chegaram à negativos 93,1%1. Variações que são índices acerca da soma de passageiros-quilômetro transportados, sendo ASK (Available Seat-Kilometers) referente à oferta e RPK (Revenue Passenger-Kilometers) à demanda.
Embora tenha tido um aumento da porcentagem em abril e maio de 2021 devido a flexibilização das normas, a melhora no setor vem reduzindo drasticamente, com tendência a continuar em queda pela nova influenza e a variante Omicrôn.
Desse modo, com a atual 7ª Rodada de Concessões Aeroportuárias é de extrema importância avaliar como a ANAC está julgando os pedidos de revisão extraordinária dos contratos de concessão aeroportuários referentes aos impactos da Covid-19. Isso, visando aferir se há segurança jurídica que atraia mais investidores e players nacionais e internacionais para a evolução do setor.
Equilíbrio Econômico-Financeiro na Aviação
Antes de se adentrar na análise dos pedidos protocolados à ANAC, é importante destacar a relevância do mecanismo de reequilíbrio econômico-financeiro aos concessionários, à sociedade e, inclusive, ao Poder Público.
O equilíbrio econômico-financeiro é conceituado como um princípio garantido constitucionalmente pelo art. 37, XXI. Isso, devido à manutenção das condições efetivas da proposta decorrente da particularidade dos contratos de concessão. Assim, o concessionário tem direito a uma revisão do contrato firmado para que as condições alteradas devido a casos como a pandemia, voltem a ser efetivas.
Ademais, a ANAC em sua própria lei dispõe sobre o seu dever de “adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento e fomento da aviação civil, da infraestrutura aeronáutica e aeroportuária do País” (art. 8º, caput lei 11.182/2005).
Assim, requer-se da agência que julgue pedidos de modo a possibilitar a prestação adequada do serviço público aeroportuário e sua continuidade (art. 6º, §1º, lei 8.987/95). Considerando que a ausência de um devido reequilíbrio pode provocar uma incapacidade das concessionárias de prestar o serviço e suas respectivas falências.
O reequilíbrio pode ser pleiteado com a elaboração de uma matriz de riscos no contrato, sendo alocados riscos a ambas as partes. O art. 2º da Resolução ANAC 528/2019, além de suas demais disposições, permite o reequilíbrio em casos de riscos alocados à Administração Pública.
A pandemia resta consolidada pelo próprio Ministério da Infraestrutura como um risco de força maior e caso fortuito que deve ser alocado à Administração Pública. A doutrina destaca, ainda, como sendo risco do Poder Concedente por ter maior capacidade de evitá-lo ou absorvê-lo de forma mais econômica.
Análise dos Pedidos à ANAC
Foram julgados 16 pedidos de revisão extraordinária com reequilíbrio pela pandemia em 5 reuniões deliberativas da ANAC. O primeiro pedido em tela foi julgado na 22ª Reunião Deliberativa Ordinária da Diretoria Colegiada em 10/11/2020. Considerando as Reuniões Deliberativas Ordinárias e Extraordinárias da Diretoria Colegiada da ANAC de 01/03/2020 até 23/01/2022.
Cabe destacar que há 1 recurso a um indeferimento desses pedidos. Embora, não tenha sido aferido nenhum pleito que tenha sido negado pela ANAC, foi pautado na 16ª Reunião Ordinária de 2021 esse recurso.
O recurso trata-se do processo 00058.031596/2020-86 que foi retirado de pauta na 16ª Reunião Deliberativa Ordinária da Diretoria Colegiada da agência. Após sua retirada ainda não houve sua reinclusão em pauta, assim, o recurso ainda aguarda julgamento. Desse modo, considerando o recurso, a ANAC aprovou 16 de 17 pedidos realizados, resultando em uma taxa de aprovação de 94,11%.
A ANAC vem adotando como metodologia de mensuração dos referidos prejuízos a diferença entre os fluxos de caixa operacional representativos do cenário (pré-base) e pós-pandemia (forecast). Isso, de modo a calcular apenas os prejuízos que tenham nexo causal com os danos da Covid-19, reequilibrando devidamente os contratos.
Assim, a agência vem cumprindo sua função reguladora e seu dever constitucional do art. 37, XXI, CF, equilibrando os contratos referentes aos prejuízos da pandemia. Função e dever essenciais para a garantia da segurança jurídica no setor e atração de players e investidores ao mercado.
Embora, ressalta-se que o valor de desequilíbrio que vem sendo considerado é o aferido pelas áreas técnicas, drasticamente distinto do pleiteado. As manifestações das concessionárias alteram pouco o valor estimado pelas áreas, mensuração técnica que requer maior aprofundamento em futuro artigo. Exemplificando brevemente a distinção, foram calculados montantes inferiores ao pleiteado em mais de 1,5 bilhão e 6 bilhões de reais, respectivamente, nos processos 00058.027573/2021-58 00058.026935/2021-93.
Conclusão
A pandemia gerou prejuízos e danos severos ao setor aeroportuário, sendo inegável os seus impactos nas concessionárias responsáveis por manter a prestação do serviço público de aviação. O princípio do equilíbrio econômico-financeiro em meio a coronavírus encontrou-se como o meio de reestabelecer as condições efetivas da proposta dos contratos de concessão, obrigação constitucionalmente determinada.
Em análise, a ANAC vem cumprindo o referido dever constitucional, aprovando quase todos os pedidos protocolados à agência, possibilitando a continuidade do serviço e proporcionando segurança jurídica ao setor aéreo.
Informações do Portal Jurídico Migalhas
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