O Comandante Sully, piloto do histórico pouso bem sucedido de um Airbus A320 na água, criticou o New York Times após o renomado jornal acusar os falecidos pilotos como culpados nos acidentes do Boeing 737 MAX.
Conhecido como Herói do Rio Hudson pela história que rendeu até filme com Tom Hanks, o piloto aposentado e com mais de 20 mil horas de voo chegou até a comentar sobre a suposta falta de experiência dos pilotos da Lion Air e Ethiopian Airways.
Sully é um ferrenho defensor de altos níveis de exigência de horas de voo para pilotos ingressarem em linha aérea, e inclusive é criticado por isso, principalmente por pilotos no início da carreira.
Porém o comandante não gosta de pregar desinformação e passar pano. O seu comentário sobre o acidente foi antes do relatório preliminar do voo Ethiopian 302 que vitimou 157 pessoas.
Desde então ficou cada vez mais claro em todo o mundo que a Boeing fez modificações no software da aeronave, tendo introduzido o MCAS – recurso que previne o avião de perder a sustentação – porém sem nunca comunicar de forma ampla a mudança aos pilotos ou companhias aéreas. E pior: dependia de apenas uma fonte de informação para tomar atitudes.
Com as investigações praticamente encerradas, o 737 MAX parado em todo mundo e a Boeing reconhecendo (em parte) seu erro, o público “se deu por satisfeito” sobre as causas do acidente.
Tudo parecia estar se definindo no caso 737 MAX, até que o renomeado autor William Langewiesche escreveu uma longa matéria com o título “O que realmente derrubou o 737 MAX?”
A matéria é muito extensa e cheia de detalhes, mas vamos relatar a seguir os principais pontos que causaram mais polêmica e crítica por parte de Sully.
Autor do artigo é conhecido de Sully
Um fato bem interessante é que William escreveu o livro Fly By Wire – The Geese, the Glide, the Miracle on the Hudson. Este livro conta a história do voo US Airways 1549 que pousou no Hudson, e como a tecnologia Fly By Wire ajudou.
Exatamente por ser o livro que conta a história do seu acidente, e que deu origem ao filme, Sully conhece bem William. O autor também é piloto mas nunca chegou na linha aérea, porém fez carreira jornalística escrevendo artigos aeronáuticos sobre acidentes.
Críticas aos pilotos mortos
Na matéria, William destaca que o Comandante Suneja, do voo 610 da Lion Air, foi contratado em 2011 num emprego de baixo nível, e que na hora do acidente tinha mais de seis mil horas.
Porém o autor destaca, sem dar dado nenhum para provar sua acusação, que “a Lion Air deu a ele pouco tempo de simulador, um uniforme, colocou ele num cockpit de 737 e fez dele um comandante de forma mais rápida que o convencional”.
Já o co-piloto do voo Lion 610, Harvino, foi contratado com 900 horas de voo (muito acima da média brasileira e quase dentro do mínimo dos EUA, que é de 1 mil horas para graduados na área). E, novamente, o autor fala que sua experiência de voo “era feita de scripts, limitada por checklists, ordens de cockpit e dependência de piloto automático”, tudo isso sem ter conhecido o tripulante.
O autor continua e critica o co-piloto por não ter detalhado os seus problemas ao controle de tráfego aéreo, limitando-se apenas a dizer “problemas no controle de voo”.
As críticas continuam no segundo acidente, envolvendo o 737 MAX da Ethiopian Airlines, aérea reconhecida mundialmente pela excelente administração, altos padrões de segurança e atendimento.
William destaca que o comandante Yared Getachew tinha apenas 29 anos, e que “graduou-se na linha de produção da academia da Ethiopian dez anos antes, e tinha 8.122 horas de voo”.
Destacando a falha no medidor do ângulo de ataque (AOA), o autor aponta que os pilotos decidiram por acionar o piloto automático do comandante, apesar de que “claramente” houve uma falha no AOA do comandante.
Vale lembrar que a única maneira imediata de detectar a falha em um dos AOA é com o alerta de divergência de AOA, que é um opcional que nem a Ethiopian nem a Lion Air tinham. Apenas a Southwest e a United adquiriram. Outra maneira de detectar, segundo a própria Boeing, seria se o piloto automático não funcionasse, o que não foi o caso.
Sully defende pilotos e alerta sobre irresponsabilidade
Ao chamar, no subtítulo, a indústria aeronáutica de culpada por supostamente colocar pilotos “inexperientes”, o autor gerou polêmica na área, e chegou até Sully, que se pronunciou, já que seu nome está associado ao autor.
O comandante afirma que William minimiza as falhas fatais de design e certificação que antecederam as tragédias, e que ainda são uma ameaça aos passageiros.
Sully até pondera quando o autor afirma que é necessário masterizar o avião para poder pilotar ele comercialmente. Mas para Sully “não é desculpa para o design mal feito do MCAS, que é uma ratoeira mortal”.
O comandante continua:
“Como algum dos poucos pilotos que sobreviveram para contar o que é estar no assento esquerdo de um avião de linha aérea quando as coisas vão realmente mal, com segundos para reagir, eu sei uma ou duas coisas sobre superar uma crise impensável.
Eu também fui um dos poucos pilotos que voaram em um simulador de Boeing 737 MAX full-motion nível D (o mais realista que existe), replicando ambos os acidentes diversas vezes. Eu sei em primeira mão os desafios que os pilotos enfrentaram, e como é errado culpar eles por não conseguir compensar um design maligno e mortal.
Estas emergências não representam um problema clássico de Runaway Stabilizer, porém inicialmente apontam para um problema ambíguo de leitura duvidosa de velocidade e altitude, mascarando o MCAS.
O design do MCAS nunca deveria ter sido aprovado, não pela Boeing, não pela FAA. O NTSB (órgão americano investigador de acidentes) concluiu que a Boeing fez premissas falsas tanto sobre a capacidade do sistema em suportar “danos” ou falhas, quanto sobre a capacidade humana assim que as falhas acontecessem em efeito cascata.
Lições destes acidentes foram feitas com sangue e devemos procurar todas as respostas para evitar o próximo acidente.
Confira a seguir as declarações anteriormente dadas pelo comandante Sully sobre os acidentes do Boeing 737 MAX: