Em meio a nuvens, pilotos perderam noção do voo e controlador avisou que eles estavam baixos demais

Eric Salard, CC BY-SA 2.0, via Wikimedia Commons

Durante um pouso noturno no dia 10 de fevereiro de 2022, os pilotos de um voo da Air France, estimando que as condições climáticas fossem favoráveis, solicitaram uma aproximação visual, autorizada pelo controlador, no entanto, a perda repentina de referências visuais devido a um “inesperado mau tempo” fez os pilotos descerem mais do que o esperado, resultado em um incidente.

O relatório do incidente, disponibilizado em 3 de abril de 2024 pela BEA, agência francesa de investigação, dá mais luz ao que aconteceu durante aquele voo e as causas do evento.

O que aconteceu

Um Airbus A320-200 pertencente à Air France, registrado sob a matrícula F-HEPB e operando o voo AF-605, partiu de Fort de France (Martinica) para Pointe-a-Pitre (Guadalupe) e estava em uma aproximação visual à pista 12 de Pointe-a-Pitre quando o comandante perdeu a referência visual do aeroporto devido a uma tempestade.

Em preparação para o pouso e antes de entrar na perna de base, o Piloto no Comando (PF) desativou o piloto automático, incluindo o A/THR (auto-aceleração). Ele pediu ao Piloto Monitorando (PM) para “gerenciar a velocidade” para ajustar as metas de velocidade calculadas pelo FMS. A fase de aproximação não foi ativada, mas foi posteriormente ativada pelo PM por meio do MCDU.

Em seguida, o PM realizou as ações associadas à extensão do trem de pouso (arme dos spoilers, ligando as luzes e anúncio de pouso iminente aos passageiros) antes de estender os flaps para a posição 3. Durante este período, que durou mais de um minuto, a carga de trabalho do PM não permitiu que ele monitorasse a rota adequadamente.

Quinze segundos após a desativação do piloto automático, o PF iniciou uma curva à direita em direção à perna de base e, em seguida, à final. Diante de algumas nuvens e precipitação, o PF perdeu a visão da pista por alguns momentos.

A angulação inicial de 15° acabou aumentando para 28°. Com este ângulo de inclinação e um vento vindo de nordeste, a aeronave ficou fora da rota desejada. A velocidade vertical aumentou para -2.000 pés/min. O trajeto erroneamente escolhido nos perfis vertical e horizontal, bem como a alta velocidade vertical, não foram detectados.

A falta momentânea de referências e do que estava acontecendo, fez o avião descer mais do que deveria, fazendo com que o sistema do Controlador de Tráfego Aéreo acionasse o alerta de MSAW (alerta de altitude mínima de segurança). Esse alerta serve para avisar ao controlador de tráfego aéreo sobre o aumento do risco de voo controlado para o terreno, gerando, em tempo hábil, um alerta de proximidade da aeronave com o terreno ou obstáculos.

Avisada pelo controlador, a tripulação percebeu seu erro. Eles verificaram que a aeronave não estava alinhada com o eixo da pista e decidiram arremeter. Após uma nova vetoração radar e uma aproximação ILS, o pouso ocorreu sem mais incidentes.

Causas apontadas pela BEA

O relatório final da BEA, divulgado em 3 de abril de 2024, concluiu que várias circunstâncias contribuíram para a ocorrência do incidente:

– Desejo de otimizar a trajetória e os tempos de voo e a vontade da tripulação de manter suas habilidades de voo sem utilizar automação. O uso frequente dessas práticas neste setor nos últimos voos realizados.

– A ameaça, não identificada durante o briefing de aproximação, devido à posição do piloto em comando (assento esquerdo) para um circuito visual à direita, incluindo a subestimação do risco de encontrar nuvens de baixa altitude.

– A decisão de usar o nível de automação correspondente às condições de luz do dia (A/THR desligado), resultando em uma carga de trabalho pesada para a tripulação e degradando o nível de desempenho de ambos os pilotos.

Carlos Ferreira
Carlos Ferreira
Managing Director - MBA em Finanças pela FGV-SP, estudioso de temas relacionados com a aviação e marketing aeronáutico há duas décadas. Grande vivência internacional e larga experiência em Data Analytics.

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