Entrevista com o Presidente da Helibras: aeronaves das Forças Armadas, engenharia, mercado e muito mais

Alberto Duek, Presidente da Helibras, na FIDAE 2024

Aproveitando a ocasião do grande evento aeroespacial FIDAE 2024, que ocorreu na última semana no Aeroporto de Santiago, no Chile, o AEROIN conversou com Alberto Duek, Presidente da Helibras, empresa brasileira sediada em Itajubá, Minas Gerais, que produz helicópteros e é subsidiária do grupo Airbus.

Duek falou sobre os projetos atuais na parceria da fabricante com as Forças Armadas do Brasil, os possíveis novos projetos nesse âmbito, as perspectivas de encomendas e entregas de helicópteros no mercado brasileiro neste ano, além de assuntos como a ampliação do setor de engenharia da Helibras e o Projeto de Lei que coloca Itajubá em destaque devido à produção de helicópteros na cidade.

O AEROIN iniciou a conversa abordando a busca do Exército Brasileiro por um helicóptero de ataque. Como mostrado no início de março, o Coronel Marco Aurélio de Castro, Chefe do Estado-Maior do Comando de Aviação do Exército Brasileiro, afirmou, durante a International Military Helicopter (IMH) 2024, que o EB discutiria a aquisição destas aeronaves em um encontro no mês seguinte.

Sobre isso, Duek destacou que a Helibras está conversando com as três Forças Armadas devido a um interesse muito grande no modelo H145M, uma aeronave multimissão que tem como uma das missões ser uma aeronave de ataque, chamado de ataque ligeiro.

“Ela já tem míssil integrado, metralhadora, canhão, etc. E já é o míssil que o Exército Brasileiro utiliza para suas aeronaves, então, para eles a aeronave cai muito bem”, ressaltou o executivo, explicando também que ainda seria possível usá-lo em outras missões, como transporte de tropa, pois possui, por exemplo, uma configuração em que se transporta o que o Exército chama de Grupo de Combate – pessoal equipado e armado.

H145M – Imagem: Divulgação – Airbus
H145M – Imagem: Divulgação – Airbus
H145M – Imagem: Divulgação – Airbus

“E se você quiser pode fazer uma missão aeromédica também, porque a grande vantagem do H145 é que ele tem, no piso, dois trilhos, e você reconfigura a aeronave toda através daqueles trilhos. É só você puxar o pino e colocar o pino que você solta e prende e faz reconfiguração para qualquer tipo de configuração de missão. Você faz em cerca de 10 minutos”, detalhou Duek.

H145 civil exposto na FIDAE 2024
H145 civil exposto na FIDAE 2024
H145 civil exposto na FIDAE 2024
H145 civil exposto na FIDAE 2024
H145 civil exposto na FIDAE 2024

O AEROIN também abordou o H125, modelo que começará a ser entregue neste ano pela Helibras para as Forças Armadas. Alberto Duek lembrou que as Forças Armadas encomendaram 27 unidades do H125 Esquilo no programa TH-X, para escolha de aeronave de treinamento, sendo 12 para a Força Aérea e 15 para a Marinha, cada uma com a sua configuração específica desenvolvida pela própria empresa em Itajubá.

“O desenvolvimento de engenharia terminou agora no final do mês de março, as aeronaves já entraram em produção e as primeira devem ser entregues a partir do meio do ano. É um projeto que está no ramp up, e a previsão é de entrega de 7 aeronaves neste ano. E estamos jogando com a questão de se as Forças Armadas vão ter orçamento para receber as 7 ou não. Estamos conversando com eles”, disse o Presidente da fabricante brasileira.

H125M – Imagem: Divulgação – Airbus

Sobre a previsão de início de entrega por volta de setembro, que vem sendo aventada pela mídia nacional, ele afirma que é provável que seja, mas que ainda não há como definir a data, pois, quando a aeronave estiver pronta, será apresentada para as Forças Armadas avaliarem e depois começarem o recebimento, o que pode durar até 40 dias.

“A gente sabe que será alguma coisa entre agosto e setembro, dependendo deles. Mas a gente pode sempre pedir. Essa é outra vantagem de ser um fabricante no país: a indústria de Defesa vira parceira das Forças Armadas, então, por o primeiro ser um marco importante, a gente pode pedir para eles uma data específica, e assim que a gente tiver combinado com eles, a gente comunicará”, explicou.

Sobre as perspectivas de entregas e encomendas de helicópteros no mercado brasileiro neste ano, Duek primeiro relembrou a dinâmica do ano passado, em que, no primeiro semestre, houve um começo lento, e no segundo semestre, voltou ao ritmo normal.

“Só na feira de aviação executiva LABACE, que acontece todo ano em agosto em Congonhas, a gente vendeu, durante a feira, seis helicópteros, o que não é uma coisa normal. Geralmente, durante feiras você faz prospecto, você assina contrato que você já negociou. Mas, desta vez, não. Seis pessoas novas chegaram lá e fecharam contrato durante a feira, e a gente está vendo essa mesma dinâmica em 2024”, disse o executivo.

Ele continuou: “Em 2024, o mercado começou super aquecido, com os primeiros dois helicópteros que nós vendemos em janeiro sendo o H145. Ele está sendo realmente o campeão, tanto no mercado civil, quando VIP, parapúblico e militar. Em termos de entregas para este ano, a gente tem cerca de 30 previstas”.

O Presidente explicou, entretanto, que muitas destas entregas estão concentradas apenas para o final do ano, porque a indústria da aviação ainda está sofrendo com o problema da cadeia de suprimentos, impactada primeiro pela Covid, depois pela guerra da Ucrânia e, agora, a guerra de Gaza e Israel.

“A gente acaba empurrando as nossas entregas para o último trimestre. No ano passado foi o caso também, mas nós conseguimos entregar tudo que estava previsto. Então, está parecendo ser um ano muito bom”, completou.

Outro aspecto abordado pelo AEROIN foi sobre existir alguma participação da engenharia da Helibras com projetos da Airbus Helicopters, Airbus UpNext e mobilidade aérea urbana, para estes projetos serem trabalhados também com engenheiros brasileiros.

Duek explicou que a Airbus trabalha muito com o que se chama de bricks of technology, ou seja, tijolos de tecnologia. “Ela pega para desenvolver um projeto global em que um vai cuidar de uma parte, outro vai cuidar de outra parte, etc, e a Helibras, de tempos em tempos, participa”, disse.

Ele detalhou que especificamente neste projeto UpNext, não houve participação, mas os clientes brasileiros vão se beneficiar de toda a tecnologia, automação e a geração de segurança que esse projeto vai colocar no mercado.

Não sei se vocês viram um vídeo que circulou, um projeto muito bacana, completamente automatizado, em que o piloto controla o helicóptero todo através de um tablet. Então, isso reduz enormemente a carga de trabalho do piloto. Ele passa daquela fase de pilot flying para a de pilot monitoring, em que vai ter muito mais atenção para aquele voo, e isso permite que seja muito mais preciso, com menos chance de haver interferência e erro humano. Então, o mercado brasileiro, o cliente brasileiro e a Helibras vão aproveitar muito dessa tecnologia”, afirmou o Presidente.

O projeto e o vídeo a que se referiu Duek podem ser vistos novamente em matéria previamente apresentada pelo AEROIN clicando aqui.

Ainda em relação à engenharia da Helibras, o AEROIN citou a recente investida da Boeing no Brasil, com a inauguração de um escritório de engenharia em que os profissionais trabalham inclusive no projeto da futura asa transônica da fabricante norte-americana.

Sobre esse paralelo com a indústria concorrente, Alberto Duek explicou: “A gente também está tendo um investimento em engenharia, mas são abordagens diferentes. A concorrência estabeleceu um escritório de engenharia aqui, em que ela contratou engenheiros do mercado para trabalhar para lá. A gente está dobrando nossa capacidade de engenharia da Helibras, mas para trabalhar em projetos aqui no Brasil, para o mercado brasileiro”.

Ele detalhou que na Airbus há uma categorização de escritórios de engenharia na qual a Helibras é um escritório de nível 1, chamado “design office level one”, que significa que tudo que é desenhado por um engenheiro brasileiro aqui pode ser reaproveitado no resto do mundo sem necessidade de nenhum outro tipo de validação de qualquer outro escritório de engenharia da Airbus.

“E a gente já teve esse caso, já exportamos produtos e o Brasil recebendo royalties em função da tecnologia desenvolvida no Brasil por engenheiros brasileiros”, lembrou Duek.

Finalizando esse ponto, o AEROIN ainda indagou se esse processo de dobrar a engenharia está agora em curso ou tem um prazo para ser colocado em prática, e quantos engenheiros há na Helibras atualmente.

O executivo afirmou que está em andamento neste momento, tendo sido iniciado no final do ano passado, com previsão de chegar no final de 2027 dobrando o escritório de engenharia. Na Helibras há cerca de 50 engenheiros hoje, e, conforme a carga de trabalho for aumentando e havendo essa demanda, a empresa seguirá contratando.

“E não é só contratar. É contratar, é treinar, é preparar. E vale destacar que o engenheiro brasileiro tem uma formação muito boa, impressionante. A gente tem várias escolas de engenharia excelentes, não só o ITA, mas a UFSCAR e a USP em São Carlos e a de Taubaté. E a própria UNIFEI em Itajubá, que é excelente. Todo ano eles formam cerca de 3 dezenas de engenheiros mecânicos aeronáuticos e a gente aproveita vários deles. Então, a gente pega esse pessoal e introduz no mundo dos helicópteros, no mundo da Airbus, da Helibras, formamos eles e começam a trabalhar para a gente”, detalhou.

O AEROIN ainda colocou em pauta o Projeto de Lei (PL) 2.653/2022, do Senador Carlos Viana, que confere ao município de Itajubá o título de Capital Nacional da Produção de Helicópteros, questionando se, na opinião de Duek, há alguma influência para a Helibras.

O PL foi aprovado no Senado Federal em junho de 2023 e remetido à Câmara dos Deputados em julho de 2023. Depois, desde que chegou à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) em setembro, segue com situação “Aguardando Designação de Relator” até a presente data, segundo consultado pelo AEROIN no sistema digital do Congresso Nacional.

O Presidente da Helibras afirmou que sim, isso ajuda porque atrai a atenção para Itajubá e para a Helibras. Ele ressalta, por exemplo, que muitos brasileiros não sabiam que havia uma fabricante de helicópteros no país, então, houve uma série de desdobramentos em decorrência desse Projeto de Lei: foram feitos vídeos sobre a Helibras, despertou a atenção de veículos de imprensa que foram entrevistar o pessoal da empresa, etc.

“E é sempre bacana ver que no Brasil a gente tem a capacidade de fabricar um helicóptero. Existia no passado a ideia de que a Helibras era só uma montadora, e aí ficou esclarecido que não, que realmente é um fabricante”, celebrou.

Ele continuou: “Por exemplo, no projeto do Esquilo, que a gente chama hoje de H125, na nossa linha de produção a gente já chegou a um índice de nacionalização de mais de 50%. No projeto do H225, o helicóptero de grande porte das Forças Armadas, nós chegamos no nível de 46% de nacionalização. Ou seja, tem várias coisas que são produzidas no Brasil, e não só na Helibras, mas também em spin-offs dos projetos. Nós qualificamos 36 indústrias nacionais para fazerem parte da cadeia de suprimentos da Helibras e da Airbus, então, a gente mostra qual é o nosso valor para o mercado, qual é o nosso valor para o país. Foi muito legal essa iniciativa do senador Carlos Viana”.

Instalações da Helibras em Itajubá – Imagem: Helibras

Por fim, o AEROIN abriu espaço para Alberto Duek deixar uma mensagem, e o que o Presidente da Helibras compartilhou foi o seguinte:

“Acho que é importante a gente dizer que a Helibras está chegando em uma fase em que grandes projetos que foram assinados lá atrás estão em vias de terminar. Por exemplo, a modernização das aeronaves do Exército Brasileiro, os Fennec, que são o Esquilo militar, e os Pantera, que são o Dolphin militar, termina agora em 2024. O programa HX-BR, que é a produção de 47 helicópteros de grande porte, termina em 2025.

Então, o Brasil é o único país que é fabricante de helicópteros na América Latina e no Hemisfério Sul, e estamos agora buscando e construindo novos projetos para a gente manter essa capacidade instalada, essa capacidade que os engenheiros brasileiros, que os técnicos brasileiros têm de fabricar helicópteros, que é um orgulho muito grande para o país.”

O AEROIN esteve presente em mais esta edição da FIDAE. Para conferir todas as notícias sobre o evento, clique aqui.

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Murilo Basseto
Murilo Bassetohttp://aeroin.net
Formado em Engenharia Mecânica e com Pós-Graduação em Engenharia de Manutenção Aeronáutica, possui mais de 6 anos de experiência na área controle técnico de manutenção aeronáutica.

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